Sob o pretexto de estabilizar a dívida pública e alcançar superávits primários, a equipe econômica do governo Bolsonaro entregou ao Congresso Nacional um pacote de maldade que pode tornar o serviço público mais caótico do que já é para a maioria da população. 

É o que aponta estudo elaborado pela procuradora federal dos Direitos do Cidadão, Deborah Duprat, sobre o “Plano Mais Brasil”, que engloba três propostas de emendas à Constituição: PECs 186, 187 e 188.

Na avaliação da procuradora todas estão eivadas de “inconstitucionalidade e incompatibilidade com tratados e convenções internacionais dos quais o Brasil é signatário”.

Elas também estão em desacordo com o pacto estabelecido na Constituição de 1988, além de não revelar transparência para alcançar o único objetivo que é a estabilização da dívida pública.

O documento de 29 páginas é mais um instrumento para subsidiar a luta dos parlamentares de oposição que veem no plano uma forma do governo Bolsonaro de destruir o Estado e o serviço público.

Eles preveem luta intensa no Parlamento, nas ruas e na Justiça para barrar o que está sendo chamado de desmonte do Estado brasileiro.

A mais perversa de todas é a PEC 186 que pretende controlar o crescimento das despesas obrigatórias de pessoal ativo e inativo de todos os estados e municípios brasileiros.

São proibidos criação de novos cargos, realização de concursos, progressão e promoção funcionais, reajustes e revisões, redução de jornada de trabalho e salários.  

Com a redução da jornada de trabalho em 25%, a tendência é piorar o serviço público em hospitais, escolas, delegacias, creches, centro de saúde e outras estruturas administrativas que já sofrem com contingenciamento de recursos e sucateamento.

A PEC 187 extingue todos os fundos públicos da União, dos estados, do Distrito Federal e dos municípios. Estão entre eles o Fundo de Amparo ao Trabalhador (FAT) e o Fundo de Financiamento ao Estudante do Ensino Superior (Fies).

Já a PEC 188 propõe acabar com a vinculação financeira dos recursos da saúde e educação, ou seja, duas áreas essenciais que passariam a compartilhar receitas. Apesar dos percentuais mínimos estarem garantidos, uma ou outra área poderia ser prejudicada com redução de recursos.

Parlamentares indicam o que precisa ser feito para barrar essa pauta de destruição do Estado brasileiro.

PEC da agiotagem

A líder da Minoria na Câmara dos Deputados, Jandira Feghali (PCdoB-RJ), diz que se trata das PECs da agiotagem por favorecerem dívidas e pagamentos financeiros.

“Elas destroem a federação, os serviços e os fundos públicos. Todos os fundos que foram construídos no Brasil para garantir verbas direcionadas a políticas públicas importantes estão sendo desmontados por essas PECs. Elas destroem, inclusive, vários municípios”, criticou.

A líder foi taxativa no sentido de que não haverá negociação em torno das propostas. “Nós vamos enfrentá-las, aliás, como vamos enfrentar toda a agenda que o governo colocou para 2020. Nós queremos reforma tributária, essa é a pauta que nos importa”, diz.

Além da reforma tributária justa, progressiva e sustentável, Jandira Feghali explicou que a Oposição quer votar o Fundo de Manutenção e Desenvolvimento da Educação Básica e de Valorização dos Profissionais da Educação (Fundeb), rever a PEC do Teto dos Gastos e a pauta federativa.

“O governo atomiza a pauta para enlouquecer a sociedade e nos enlouquecer. Nós não vamos negociar essa pauta, essa pauta não é nossa”, disse.

Greve geral

A vice-líder da Minoria na Câmara, deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), que é uma das coordenadoras da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Serviço Público, diz que a PEC 186 “arrebenta com todos os serviços públicos, suspende concursos, interfere nas carreiras, acaba com as profissões regulamentas, constitui um óbice à fiscalização desses trabalhos, diminui jornada e salários”.

“É uma desconstrução do Estado nacional de uma maneira avassaladora, uma cajadada só. O governo manda uma PEC para aniquilar com o que resta de CLT (Consolidação das Leis do Trabalho), mexe com 60 artigos e a outra PEC arrebenta o serviço público nas suas mais fundamentais funções”, avaliou.

Para ela, há o risco de ficarem no Estado apenas algumas profissões consideradas típicas e sem as garantias dos serviços públicos serem prestados com a devida excelência. “Isso muito nos preocupa.”

“O serviço público está em pé de guerra. Eu acredito que uma greve geral acabará acontecendo não somente entre os servidores públicos, poderá disseminar o que hoje na Petrobras já acontece (greve dos petroleiros).

Alice Portugal diz que, a partir do estudo da procuradora, os partidos podem ser mobilizados para ingressarem com ações no Supremo Tribunal Federal (STF) para impedir a tramitação das PECs.

Fundos públicos

Além do enfrentamento do debate no Congresso, o deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA) defendeu um diálogo maior com a sociedade e com os setores que defendem a soberania, os direitos sociais e dos trabalhadores.

“Não é possível que o governo pretenda acabar com os fundos púbicos que são fundamentais para produzir política de desenvolvimento e de proteção social. Não é possível que acabe com estabilidade, direitos dos servidores, estruturas públicas que prestam serviço a nossa sociedade em todas as áreas: educação, saúde e segurança”, afirmou.

Daniel Almeida diz que é desprezível atacar a área de proteção social num país com uma população carente e um quadro de profundas desigualdades sociais.