O Plenário da Câmara dos Deputados aprovou 12 das 23 emendas do Senado do Projeto de Lei (PL) 7735/14, que simplifica as regras para pesquisa e exploração do patrimônio genético de plantas e animais nativos e para o uso dos conhecimentos indígenas ou tradicionais sobre eles. Com isso, os parlamentares concluíram a votação do projeto nesta segunda-feira (27) e o texto seguirá para sanção presidencial.

Apesar de representar um avanço em relação à legislação atual (Medida Provisória 2.186-16/01), por desburocratizar o acesso dos pesquisadores aos recursos genéticos brasileiros e conhecimentos tradicionais associados, acordos entre ruralistas e peemedebistas impediram qualquer mudança que significasse perdas para as indústrias farmacêuticas e de cosméticos e avanços para povos indígenas e tradicionais.

As emendas feitas no Senado tentavam devolver ao projeto um equilíbrio de forças, mas foram rejeitadas pelo relator da matéria, deputado Alceu Moreira (PMDB-RS). Entre elas, estão as que pretendiam permitir a consideração de qualquer elemento que agregasse valor ao produto acabado – oriundo de acesso ao patrimônio genético ou do conhecimento tradicional associado – como passível de gerar repartição de benefícios, uma espécie de royalty a ser pago por esse acesso.

Para a deputada Luciana Santos (PCdoB-PE) era importante ter garantido especificações no projeto referentes aos povos indígenas e à agricultura familiar, por exemplo. Segundo Luciana, os conceitos precisavam ser ampliados para evitar injustiças na repartição de benefícios “justamente com quem mais precisa dela”. “Não se poderia ter tirado os direitos das comunidades tradicionais e dos conhecimentos associados. Desse jeito não vamos repartir benefícios, estamos negando um direito já ratificado pelo Brasil. É um retrocesso”, afirma a parlamentar.

A repartição de benefício é um instrumento previsto pela Convenção da Diversidade Biológica (CDB), tratado internacional que regula o tema. A convenção determina que quem usa e explora economicamente os recursos genéticos e conhecimentos tradicionais deve remunerar, de forma “justa e equitativa”, os detentores desses recursos e conhecimentos (os povos indígenas e tradicionais), reconhecendo-os como instrumento valioso de produção de saber. O novo Marco da Biodiversidade, no entanto, ignora a CDB.

“O direito à repartição fica restringido com essa redação. O projeto original tinha um desequilíbrio entre os interesses das empresas e os direitos de comunidades tradicionais, que sequer foram consultadas na construção desse projeto. Esse desequilíbrio foi mantido, sobretudo, em relação à repartição de benefícios”, reforça Maurício Guetta, advogado do Instituto Socioambiental (ISA).

Repartição não monetária

O relator rejeitou ainda o texto do Senado sobre repartição não monetária. De acordo com a emenda enviada, nesta modalidade, a destinação deveria ser feita para unidades de conservação, terras indígenas, territórios quilombolas e áreas prioritárias para a conservação. A redação aprovada, no entanto, permite que o explorador do produto ou material indique o beneficiário.

“Da forma como ficou, essa repartição será mais um investimento para o explorador do que repartição de benefícios”, afirma Guetta.

Avanço

Nem tudo, porém, é retrocesso no projeto aprovado. Entre as conquistas, está a proibição de empresas sediadas no exterior e sem vínculo com instituições nacionais de pesquisa científica e tecnológica de conseguir autorização para acesso ou remessa ao exterior de patrimônio genético ou de conhecimento tradicional associado – luta encabeçada pelo PCdoB desde a primeira votação do PL na Câmara. “É uma questão de soberania. Um avanço importante que obtivemos no Senado e foi mantido nesta Casa”, diz a parlamentar.