Retrocesso à vista. Esse é o alerta que se acendeu após a aprovação relâmpago na noite de quarta-feira (12) da urgência do projeto que equipara aborto a homicídio. Numa votação que durou 23 segundos, deputados bolsonaristas conseguiram avançar com a proposta, impedindo que o texto tenha amplo debate nas comissões relacionadas ao tema do projeto e seja deliberado diretamente pelo Plenário da Câmara.

PCdoB, PSol, PT e PSB registraram suas discordâncias com a votação do regime de urgência. O tema não foi anunciado pelo presidente da Câmara, Arthur Lira (PP-AL), que declarou a matéria aprovada depois de 23 segundos de maneira simbólica, ou seja, quando não há registro de voto dos deputados no painel.

“Não podemos retroceder! A extrema direita está tentando aprovar o PL 1904/24, que impõe a mulheres e crianças vítimas de violência sexual a obrigação de levar adiante uma gravidez indesejada. Em busca de likes, esquecem do mais importante: a vida e o bem-estar dessas pessoas. Criança não é mãe! Estuprador não é pai! Não vamos aceitar isso”, destacou a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ).

Em discurso no Plenário, a parlamentar lembrou que o aborto já é ilegal no Brasil e que já existe pena no Código Penal. “Isso não é matéria de religião nem de polícia, isso é uma matéria da saúde pública brasileira, e como tal deveria ser debatida. Desde 1940, o Código Penal coloca três possibilidades em que a mulher pode abortar sem que seja considerado crime: no caso do próprio risco de vida dela; no caso de ser uma gestação resultante de estupro; no caso da anencefalia, por decisão do Supremo Tribunal Federal. A maioria das estupradas são as mais pobres, as mais vulneráveis e as mais jovens, que são meninas e adolescentes que são estupradas, na maioria dos casos, pelo pai biológico, pelo padrasto ou por alguém da família. São essas pessoas que vocês estão criminalizando aqui”, disse Jandira.

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Apelidado de “PL dos estupradores”, o texto, de autoria do deputado Sóstenes Cavalcante (PL-RJ), criminaliza vítimas de estupro ao equiparar o aborto de gestação acima de 22 semanas ao homicídio. O texto aumenta de 10 para 20 anos a pena máxima para quem fizer o procedimento e fixa em 22 semanas de gestação o prazo máximo para abortos legais. Hoje, a lei permite o aborto nos casos de estupro, de risco de vida à mulher e de anencefalia fetal (quando não há formação do cérebro do feto) e não determina tempo máximo de gestação para o aborto legal.

“É um absurdo! Para a extrema direita, uma mulher ou criança que foi violentada sexualmente deve ser presa em até 20 anos por homicídio se interromper a gestação a partir da 22ª semana. Criança não é mãe e estuprador não é pai”, disse a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) em suas redes.

A deputada Daiana Santos (PCdoB-RS) também condenou o avanço da matéria. Para ela, a aprovação da urgência demonstra “o descaso com a vida das mulheres”.

O líder do PCdoB na Câmara, deputado Márcio Jerry (PCdoB-MA), também repudiou a aprovação da urgência e classificou a proposta como um “absurdo”. “O PL do aborto carrega em si a possibilidade de condenar com pena severa quem já foi vítima do hediondo crime de estupro. Absurdo!”

Apesar da urgência aprovada, Lira ainda não determinou data para a votação do mérito da matéria.