Concentrados em frente à Universidade Federal do Paraná, milhares de pessoas demonstram sua solidariedade ao presidente Luiz Inácio Lula da Silva. Movimentos estudantis, sindicais e lideranças políticas se intercalam num palco montado na praça Santos Andrade, em Curitiba.

“É esse o golpe que eles querem dar, saqueando o povo brasileiro. Esta é a justiça que deixa derramar o sangue do povo brasileiro, que criminaliza quem luta e carrega esta bandeira de verdade. Estão criminalizando o Lula pelo medo que tem de sua vitória nas urnas em 2018”, alerta uma jovem estudante empunhando a bandeira brasileira.

Lula foi ouvido por Moro nesta quarta-feira (10), sob a acusação de ter recebido propina da empreiteira OAS por meio da reserva e reforma de um tríplex no edifício Solaris, no Guarujá (São Paulo), em 2009. A defesa de Lula nega a acusação e apresentou à Justiça Federal documentos que revelam que o imóvel nunca deixou de pertencer à OAS.

“Agora investigam a propriedade de um apartamento que não é dele. Está provado que não é dele. A gente apoia o combate à corrupção, mas não compactuamos com perseguição e seletividade. Eles agem contra o projeto que ele representa, pois Lula provou que é possível fazer um Brasil voltado para os mais humildes”, afirmou a senadora Vanessa Grazziotin (PCdoB-AM) em entrevista para Rede TVT.

Dias antes do depoimento, o juiz Sérgio Moro fez um pronunciamento pelas redes sociais. Moro solicitou que as pessoas ficassem em casa para não haver “tumulto”, se posicionando politicamente. Uma emissora de televisão chegou a reproduzir o recado em horário nobre.

A espetacularização do processo e dos agentes do poder judiciário nele envolvidos foi denunciada pelo deputado federal Orlando Silva (PCdoB-SP). “A verdade é que Sergio Moro age ao arrepio da lei com a finalidade de entregar o "troféu" que prometeu a seus seguidores: a condenação de Lula”, disparou o parlamentar.

Outra tentativa frustrada de cercear a liberdade da militância pró-democracia partiu da juíza Diele Denardin Zydek, da 5ª Vara de Fazenda Pública da capital paranaense. Ela chegou a determinar, através de liminar, que nenhum acampamento ou aglomeração seria permitido, estipulando uma multa de R$ 50 mil por dia em caso de descumprimento.  

Na madrugada de terça-feira (9) esta determinação foi cassada pelo Tribunal de Justiça do Paraná. De acordo com a Defensoria, a juíza concedeu a liminar de forma genérica a fim de impossibilitar o exercício dos direitos constitucionais de locomoção e manifestação.

As ruas da cidade foram tomadas de vermelho, verde e amarelo na noite do mesmo dia. Mal o sol se ergueu no horizonte e os trabalhadores, estudantes e militantes de esquerda seguiram em caminhada, embaladas por palavras de ordem em prol do Estado Democrático de Direito e por uma justiça imparcial. Às 10h, foi inaugurado o Acampamento pela Democracia, com um grande ato político.

A defesa de Lula teve negada a solicitação de gravação do depoimento pelos advogados, como também a mudança do sistema de captação das imagens (fixado no réu) pelo próprio Juízo. A negativa, segundo os advogados do ex-presidente Cristiano Zanin Martins e Valeska Teixeira Zanin Martins, “afronta expressa disposição legal e, por isso, configura mais uma arbitrariedade".

Nem mesmo a possibilidade de transmissão ao vivo foi levada em consideração pelo juiz Sérgio Moro, que em outros momentos autorizou a liberação de áudios, vídeos e delação para a grande mídia. “Não querem deixar ele falar para a sociedade para que depois sejam divulgados apenas trechos editados pela imprensa. E  no mesmo dia começou a aparecer um monte de delações focadas no presidente. Isto tudo é muito estranho”, reforçou a vice-líder da Oposição na Câmara, deputada Jandira Feghali Jandira.

Quando Lula chegou na sede da Justiça Federal, foi imediatamente cercado pela multidão que gritava “Lula, guerreiro do povo brasileiro”, recebendo o abraço de diversas lideranças políticas, estudantis e sindicais. “A agenda hoje é pelo retorno da democracia, por um judiciário imparcial e que Lula tem o direito da sua defesa”, afirmou o deputado Elvino Bohn Gass (PT-RS).

Em seu depoimento, o presidente Lula destacou ao juiz Sérgio Moro que os vazamentos que saem para a imprensa tentam criminalizá-lo de todas as formas. “Eu estou sendo julgado pela construção de um powerpoint mentiroso. Fizeram um powerpoint porque já tinham a tese de que o PT era uma organização criminosa, que o Lula por ser presidente era o chefe. E que, portanto, o Lula montou o governo para roubar. Uma tese eminentemente política”.   

O presidente foi interrompido inúmeras vezes pelo juiz paranaense, impedindo que fizesse sua defesa. “Os meus acusadores nunca tiveram 10% do respeito que eu tenho por eles. Tudo passa por eles. Antes, durante e depois. Eles parecem que tem mais provas do que os advogados de defesa e acusação. Eu quero que parem com ilações e apresentem provas”, ressaltou Lula.

Do lado de fora, todos seguiram para a praça Santos Andrade, região central de Curitiba, onde foram concentrados os atos da esquerda. Cercando o local, mais de 500 policiais fortemente armados, em clima de guerra civil, serviam ao aparato repressor do Estado. No palco montado para receber as mais diferentes falas, a líder do PCdoB na Câmara, deputada Alice Portugal, salientou que aquele era um momento de “desagravo”.

Ela enfatizou que não houve qualquer comprovação de ilicitudes, sendo este um processo meramente político comandado pela direita. “O que estamos vivendo é um preâmbulo eleitoral em que se tenta inviabilizar um líder nacional capaz de fazer o resgate de um legado social, um governo que tinha problemas, mas onde direitos foram conquistados”, disse a líder comunista.

Para a deputada Jô Moraes (PCdoB-MG), não será em um confronto entre um réu e um juiz que a crise brasileira será superada.  “Nós acreditamos que este país vai superar esta crise, mas não com reformas que tiram direitos; não com reformas políticas que restringem a participação popular, mas com a conquista do direito de todos os brasileiros”.

Na mesma linha, a Frente de Juristas pela Democracia havia emitido nota no dia 4 de abril, na qual salienta que a ação do juiz Sérgio Moro é “flagrantemente parcial e ativista”. Ainda para os juristas, a atuação de Moro, coloca em risco a credibilidade do exercício da magistratura, violando o “justo processo”.

O ex-deputado Constituinte, Aldo Arantes, falou em nome do Partido Comunista do Brasil (PCdoB) na defesa da democracia. Para ele existe um projeto para “acabar com a esquerda brasileira, o movimento sindical e a luta dos trabalhadores. Lula tem o direito de ser candidato e ser reeleito se essa for a vontade do povo brasileiro”.

Reforçando a tese de que a saída para o retorno da estabilidade institucional passa pelo campo popular, o economista e líder do Movimento dos Trabalhadores Sem-Terra (MST), João Pedro Stédile pediu a imediata convocação de “eleições gerais para a construção de um novo pacto social. A disputa das ideias tem que ser feita nas urnas, não nos tribunais ou na imprensa brasileira”.

Durante seu discurso, a presidente Dilma Rousseff voltou a afirmar que foi derrubada por uma conspiração para aprovar reformas que retiram direitos do povo. “Nem na ditadura militar ousaram tirar o direito dos trabalhadores. Estão produzindo um retrocesso na Previdência. É isto que eles querem. Nós não vamos deixar! Eles deram o golpe porque por quatro vezes perderam as eleições”, disse.

Aplaudido pela multidão, Lula encerrou o ato pedindo para ser julgado “por provas”. “Se um dia eu tiver cometido um erro, não quero ser julgado apenas pela justiça. Quero ser julgado pelo povo brasileiro. Eu não quero ser julgado por interpretações”, enfatizou o presidente.

E encerrou pedindo para que cada manifestante olhasse em seu olho. ”Minha Mãe dizia que a gente conhece quando uma pessoa está falando a verdade não é pela boca, é pelos olhos”.