O imposto sobre grandes fortunas é o único dos sete tributos federais previstos na Constituição de 1988 que ainda aguarda regulamentação. O tema volta à pauta da Câmara, no momento em que a Casa instala as comissões especiais que vão analisar as Medidas Provisórias (MPs) 664 e 665, que mudam as regras na concessão da pensão por morte e do seguro-desemprego, apresentadas pelo governo no final de 2014. Segundo a Bancada do PCdoB, além das medidas envolvendo os trabalhadores, é preciso olhar também para os mais ricos.

Há 26 anos, tramitam propostas no Congresso sobre a matéria. A pauta já foi apresentada no Congresso Nacional por pelo menos dez parlamentares, de diferentes partidos: PCdoB, PT, PSol, PV, PPS e até do PSDB. O imposto, no entanto, nunca chegou a ser votado. Diante da omissão do Parlamento, nesta segunda-feira (16), o governador do Maranhão, Flávio Dino (PCdoB), pediu ao Supremo Tribunal Federal (STF) a imediata regulação do imposto sobre grandes fortunas.

Dino apoia a proposta da líder do PCdoB na Câmara, deputada Jandira Feghali (RJ), por acreditar que brasileiros com patrimônio acima de R$ 4 milhões devem contribuir um pouco mais para o financiamento de políticas públicas no país. “A Constituição não pede. Ela manda que, no Brasil, haja um imposto sobre grandes fortunas. Omissão legislativa é inconstitucional. Na nossa visão, o Supremo não pode, ele deve suprir as omissões inconstitucionais. Freios e contrapesos valem para ações e omissões”, explica o governador maranhense.

O Projeto de Lei Complementar (PLP) 10/15, da deputada Jandira Feghali, prevê a Contribuição Social sobre Grandes Fortunas. De acordo com a proposta, a arrecadação pode gerar aproximadamente R$ 20 bilhões anuais para a saúde. Isso porque o projeto prevê a destinação integral daquilo que for arrecadado para o Fundo Nacional de Saúde, numa tentativa de combater o sub-financiamento do setor.

“Infelizmente, nosso sistema tributário ainda é bastante regressivo e, portanto, injusto para com os que vivem da renda do trabalho e benevolente para com os que sonegam e especulam. Desde a redemocratização, cobra-se mais de quem tem menos e nada cobra-se da minoria que muito tem”, diz Jandira.

Em entrevista à TV Afiada, a líder do PCdoB na Câmara anunciou que o governo estuda seriamente a medida – apesar de matérias da grande mídia veicularem o recuo do atual ministro da Fazenda, Joaquim Levy, sobre o assunto.

Para o presidente da Central dos Trabalhadores e Trabalhadoras do Brasil (CTB), Adilson Araújo, o PCdoB está no caminho certo ao querer regulamentar o inciso VII, do art. 153, da Constituição Federal. “Chega de se penalizar apenas o trabalhador.”

Entenda a proposta

Em que países já existe taxação de grandes fortunas? Holanda, França, Suíça, Noruega, Islândia, Luxemburgo, Hungria e Espanha. Na América do Sul, a Argentina é pioneira nessa lei.

Por que o foco são os mais ricos? A ideia é assegurar mais justiça tributária. Atualmente, cobram-se muitos tributos de quem pouco tem e alivia-se a carga tributária dos que têm maior patrimônio.

Quem pagará a Contribuição Social sobre Grandes Fortunas? 1) Pessoas físicas domiciliadas no país, com patrimônio a partir de R$ 4 milhões. 2) Pessoa física domiciliada no exterior, em relação ao patrimônio que detenha no país. 3) O espólio dessas pessoas físicas. Cada cônjuge, companheiro ou companheira será tributado com base no seu patrimônio individual acrescido da metade do patrimônio comum, se houver, e da integralidade do patrimônio dos seus dependentes.

Como serão cobrados os valores? A proposta estabelece nove faixas de contribuição, com alíquotas diferenciadas e iniciando a tributação a partir de um patrimônio declarado superior a R$ 4 milhões. A cobrança atingirá menos de 50 mil contribuintes.

Qual é a previsão de receita? A expectativa de arrecadação chegaria a quase R$ 14 bilhões, mantida a concentração de cobrança na última faixa, acima de R$ 150 milhões de patrimônio. Dos R$ 14 bilhões esperados, R$ 10 bilhões viriam desses contribuintes, cerca de 600 pessoas. Em valores corrigidos, o montante poderia chegar a R$ 20 bilhões, já que os dados fornecidos pela Receita Federal têm como base os anos de 2008 e 2009.
Como serão utilizados os recursos arrecadados? Serão depositados direta e integralmente no Fundo Nacional de Saúde e destinados, exclusivamente, ao financiamento das ações e dos serviços públicos do setor, em acréscimo ao mínimo constitucional já previsto para a área.

Quem fiscalizará o cumprimento da lei? A administração, a fiscalização e a cobrança da contribuição serão feitas pela Secretaria da Receita Federal do Brasil.

Como surgiu a iniciativa? A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) foi relatora do Projeto de Lei Complementar (PLP) 48/11 na Comissão de Seguridade Social e Família. Com o arquivamento da proposta no ano passado, ela reapresentou sua relatoria por meio do PLP 10/15, que cria a Contribuição Social sobre Grandes Fortunas. O projeto está sujeito à votação em Plenário.

Por que melhora a saúde brasileira? 1) Hoje faltam pelo menos R$ 50 bilhões para atender às principais demandas da saúde. É urgente ampliar as fontes de receita. A escassez de recursos é evidente quando se compara o Brasil com outros países. Em locais onde existem sistemas universais de saúde, o gasto público corresponde, em média, a 6,5% do Produto Interno Bruto (PIB). No Brasil, esse percentual é menor: 3,7%. 2) Outro dado que indica o sub-financiamento da área: nos países com sistemas universais de saúde, o setor público é responsável por 70% do gasto total em saúde. No Brasil, o gasto público representa menos de 45% do total. Conforme dados da OMS, 75% dos países possuem uma proporção de gasto público em saúde maior do que o montante brasileiro. 3) Com a proposta, seria possível, por exemplo, melhorar o atendimento no Sistema Único de Saúde (SUS), adquirir equipamentos e modernizar a infraestrutura.