Na última reunião da Comissão Especial da Reforma Política, a discussão acerca dos instrumentos de democracia direta, item central da pauta, acabou sendo ofuscada pelo debate sobre o método de confecção do parecer final do relator, deputado Henrique Fontana. Este expôs sua vontade de elaborar seu voto a partir da percepção de possíveis consensos construídos pelo colegiado, independente de suas convicções políticas pessoais ou partidárias.

O assunto surgiu da preocupação de alguns deputados com o método de trabalho da Comissão, notadamente diferente daquele empregado pelo Senado Federal para tratar do tema. Naquela Casa, decidiu-se por votar os temas da Reforma Política separadamente, procedendo-se a deliberações pontuais logo após as discussões. Na Câmara dos Deputados, contudo, optou-se por debater mais amplamente e em prazo mais elástico a Reforma para, só após encerrado o período de debates e de audiências públicas, encaminhar uma proposição.

Desde o início dos trabalhos, muitos parlamentares tem apresentado discordância com relação ao método empregado, provavelmente movidos pela sensação de que a Câmara ainda não alcançou nenhuma decisão, ao passo que o Senado deliberou sobre vários temas semana após semana. A partir dessa preocupação, alguns deputados aproveitaram a última reunião da Comissão Especial para ensejar discussão metodológica.

No debate, ganhou força a ideia de "fatiar" a Reforma. Sugeriu-se que o relator apresentasse "relatórios parciais" para que os parlamentares pudessem avançar em pontos de consenso, sob o pretexto de "prestar contas do trabalho da Comissão à sociedade". Apesar de, à primeira vista, parecer uma ideia inofensiva e bem intencionada, há de se ter alguma cautela com a sugestão para não se cair na tentação de votar itens que agradem a maioria ou que alcancem consenso separadamente de outros pontos de que possam ser dependentes.

Quando se fala na necessidade de "reforma do sistema político", o próprio termo utilizado denota a importância de uma interpretação sistemática das normas que norteiam as relações políticas da nossa sociedade. Assim, é sempre perigoso discutir modificações pontuais sem ter em vista suas implicações no conjunto maior de normas, que, repise-se, opera como sistema.

No caso, há fortes indícios de que um tema muito caro ao PCdoB possa ser objeto de fatiamento: a extinção das coligações. Diante da grande possibilidade de temas mais vultuosos (como o sistema eleitoral e o financiamento de campanha) não conseguirem ser votados, começa a adquirir contornos de realidade a hipótese de o tema ser votado separadamente, sob argumento de um falso consenso que se tenta construir na Comissão, o que seria desastroso. Este ponto foi, inclusive, tema de objeção do deputado Daniel Almeida, que, na referida reunião, fez questão de reafirmar que não há consenso com relação ao fatiamento e menos ainda no que tange à extinção das coligações.

Obviamente, trata-se de assunto que tem implicações graves a depender de diversos outros: sistema eleitoral, financiamento de campanha, quociente eleitoral, propaganda, entre vários outros. Não obstante, a ganância dos grandes partidos em ampliar sua representação – e, assim, diminuir de forma drástica o espaço dos partidos menos poderosos – levou alguns parlamentares a levantar a bandeira do fatiamento na última reunião da Comissão Especial da Reforma Política.

A ideia sempre esteve presente e vem ganhando força progressivamente. Embora no início das discussões somente se falava de forma tímida a respeito dessa possibilidade, ela já começa a ser defendida publicamente. Tudo indica que ela há de crescer e adquirir mais adeptos ansiosos por apresentar resultados parciais da Reforma Política, sob o pretexto de "prestar contas à sociedade".