Projeto de lei complementar n.º 306, de 2008
O PLP 306/08 é a versão do Senado para a regulamentação da EC 29/2000, que assegura a aplicação de recursos mínimos para o financiamento de ações e serviços públicos de saúde, para União, Estados, DF e municípios. Com essa iniciativa, as modificações promovidas pela CD serão submetidas a ratificação no Senado.
A EC 29 determinou que uma lei complementar disciplinaria: o que seria aplicado pela União; o percentual sobre as receitas líquidas a ser aplicado por estados e municípios; os critérios de rateio dos recursos vinculados à saúde; as normas de fiscalização, avaliação e controle das despesas com saúde nas esferas federal, estadual, distrital e municipal. Ficou estabelecido ainda a obrigatoriedade de revisão desses itens a cada cinco anos e ainda regras de transição.
A Câmara votou, ao final de 2007, o PLP 1/2003 regulamentando a EC 29, essa proposição continua tramitando no Senado Federal, portanto o que está sendo discutido não é o substitutivo do Senado ao projeto da Câmara, é uma nova proposição, que emendada retornará à Casa inicial.
A diferença entre as propostas da Câmara e do Senado
A principal diferença entre a proposta aprovada na CD e do Senado está relacionada ao montante a ser aplicado pela União:
– o projeto da Câmara determina a continuidade da vinculação ao PIB nominal (o que foi empenhado no exercício anterior, mais a variação nominal do PIB); são também previstos aportes extra de recursos vinculados à arrecadação da CPMF;
– o projeto do SF determina serem aplicados 10% das receitas correntes brutas, uma definição da Lei nº 4.320/64. Para 2008, com as regras de transição (vão até 2011), deveriam ser aplicados 8,5% dessa RCB, o que daria algo em torno de R$ 60 bilhões – na lei orçamentária os recursos do MS, feitas as exclusões determinadas somam R$ 48 bilhões.
A implementação das mudanças propostas pelo SF significa um reforço orçamentário alto, independentemente do mérito associado à demanda do setor.
Embora a grande oposição declarada ao projeto do Senado esteja sendo manifestada pela União, também estados e municípios terão dificuldades na aplicação da regulamentação. Eles já vêm aplicando os mesmos percentuais de 12% (estados) e 15% (municípios) constantes do projeto, no entanto, muitas das despesas que hoje são incluídas como despesas de saúde deixarão de sê-lo e muitas exclusões de receitas hoje praticadas ficarão proibidas.
A definição do que pode e do que não pode ser computado para fins da aplicação mínima de recursos dos dois projetos é praticamente igual nos dois projetos. Mas, há pequenas diferenças relacionadas aos processos de aplicação dos recursos e aos instrumentos de prestação de contas e de controle social.
Suprir mecanismos de financiamento para a Saúde.
A implementação da regulamentação contida neste PLP significa um grande esforço fiscal já para o presente exercício. A LOA de 2008 prevê a realização de R$ 709 bilhões de receitas correntes brutas. A aplicação de 8,5% desses recursos representa R$ 60,2 bilhões. Isto significa acrescer mais R$ 12 bilhões (25% a mais do que os R$ 48 bilhões já alocados para a saúde na lei orçamentária). Mesmo que parte dessas receitas não se realizem, e uma quebra de R$ 15 bilhões se verifique, seriam necessários recursos superiores a R$ 10 bilhões para este ano.
Assim, várias lideranças da base governista apontam a necessidade de especificação de novas fontes de receitas, para compensar o fim da CPMF, sendo estudada a criação de uma nova contribuição social sobre movimentações financeiras.
Nos termos constitucionais, qualquer lei ordinária pode criar essa nova contribuição social, desde que não seja cumulativa e nem incida sobre fatos geradores ou base de cálculo de outros já tributados identificados na CF. Não haveria problemas em equacionar essas duas restrições.
A criação dessa nova fonte pode estar consignada em lei complementar, várias matérias de competência de lei ordinária já foram aprovadas dessa forma.
Mas, saliente-se que quando um tributo é criado por uma emenda constitucional, posteriormente ele é instituído pela lei ordinária, que vai especificar a base de incidência e equacionando toda a problemática jurídica envolvida. Ao fazê-lo diretamente por lei, como se pretende agora, é preciso desde já detalhar todos os aspectos, praticamente reproduzindo a Lei n.º 9.539, de 1997, com os devidos ajustes.
Qualquer omissão, dubiedade ou problema na elaboração do texto poderá resultar em complicações jurídicas.
Também é preciso atenção especial para o rito de tramitação do PLP. Como está em regime de urgência urgentíssima (RI Art. 155), qualquer emenda precisará ter o apoiamento de 103 deputados ou de líderes que os representem, supera o número de parlamentares do Bloco.
Regulamentar a EC 29 produz efeitos que ultrapassam os que decorrem da ampliação dos recursos federais destinados à Saúde. A regulamentação disciplinará onde União, Estados e Municípios gastam esses recursos, impedindo os desvios hoje praticados, e ainda resultará na ampliação dos mecanismos de controle interno e externo sobre esse setor e facilitará o controle social.
No entanto, não podem passar despercebidos os problemas que resultaram de aprovarmos um aumento de recursos para a saúde, que produz efeitos já para o presente exercício, quando a oposição no Senado conseguiu derrotar a prorrogação da CPMF, cortando R$ 40 bilhões de receitas no orçamento, sendo desses R$ 17 bilhões diretamente para a saúde.
É preciso ainda ressaltar que a vinculação à receita corrente bruta não se demonstra um mecanismo apropriado, pois envolve, no cálculo, recursos que não pertencem à União, como os que são transferidos pelos fundos constitucionais, as vinculações previdenciárias etc. Se há a opção política de vincular as verbas da saúde à arrecadação, é mais adequado falarmos em receita líquida, onde são feitas esses descontos, mesmo que, para isso, o percentual a ser destinado fosse maior – ele incidiria sobre um montante de recursos que realmente o orçamento federal pode dispor.
A manutenção do vínculo ao PIB, utilizado desde 2000, também não pode ser descartada, desde que o patamar inicial a ser estabelecido consiga dar às políticas públicas de saúde as garantias necessárias para a ampliação imediata dos recursos envolvidos.
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* Esta nota foi elaborada por Flávio Tonelli Vaz, assessor técnico dessa Liderança. As opiniões aqui contidas são de responsabilidade exclusiva do autor, não refletindo necessariamente o posicionamento da Bancada ou de qualquer dos seus membros
O PLP 306/2008 é de autoria do senador Tião Viana – PT /AC.