Após três meses de análise em comissão especial, a reforma política chegou ao Plenário da Câmara dos Deputados. No entanto, o texto apreciado foi apresentado horas antes do início da sessão deliberativa pelo novo relator, o ex-presidente da comissão especial, Rodrigo Maia (DEM-RJ), uma vez que o colegiado não finalizou seu trabalho, após divergências entre o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), e o correligionário e então relator da matéria, deputado Marcelo Castro (PI).

Entre os principais pontos do novo texto, em análise na primeira noite de votação (26), estavam a mudança do sistema eleitoral para o “distritão”, onde os mais votados são eleitos; e a constitucionalização do financiamento empresarial. Após intenso debate, os parlamentares rejeitaram as duas propostas.

Para o deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), o resultado da votação da noite anterior deixa uma lição que já devia ter sido entendida pela maioria dos deputados: a necessidade da participação da sociedade na construção deste processo.

“Reforma política sem a participação popular, sem a sociedade acompanhar, se mobilizar em torno dela, não tem possibilidade de prosperar nesta Casa. E por uma razão muito simples: este é um tema muito complexo; na cabeça de cada parlamentar há uma opinião sobre reforma política; e os que chegaram aqui por este sistema, dificilmente farão modificações que possam colocar dúvidas sobre a possibilidade desses parlamentares voltarem ao Congresso. Então, ou se tem uma participação efetiva da sociedade, com mobilização e debate, em torno de pontos centrais ou a gente não terá condições de fazer reforma política”, avalia.

Financiamento empresarial nunca mais!

Para os comunistas, a principal vitória da quarta-feira foi a derrota da emenda 22 do PMDB, que incluía na Constituição Federal o financiamento empresarial a partidos e candidatos. Apesar de ter tido 264 votos favoráveis contra 207, a proposta foi rejeitada porque mudanças na Constituição precisam de, pelo menos, 308 votos a favor.

Para a líder do PCdoB na Câmara, deputada Jandira Feghali (RJ), a questão do financiamento era decisiva, independentemente da escolha sobre o sistema eleitoral. “A contribuição empresarial determina o resultado da eleição e piora a distorção de representação que vivemos hoje. Basta vermos a composição deste Congresso para entendermos a importância do fim do financiamento empresarial de campanhas”, afirma a deputada.

A Bancada do PCdoB defende a proposta apresentada pela Coalizão pela Reforma Política Democrática e Eleições Limpas, que tramita desde 2013 na Câmara como o Projeto de Lei (PL) 6316. O PL estabelece o financiamento público e doações de pessoas físicas de até R$ 700. De acordo com o projeto, para financiar as campanhas, um novo fundo eleitoral deveria ser constituído por recursos do Orçamento Geral da União, de multas administrativas e de penalidades eleitorais.

Os deputados Aliel Machado (PCdoB-PR) e Alice Portugal (PCdoB-BA), ainda no Plenário, comemoraram a rejeição da proposta peemedebista. Para eles, todos os que dizem defender o combate à corrupção deviam ter votado contra o financiamento empresarial. “Não é possível que o capital seja o maior cabo eleitoral do Brasil. Felizmente, vencemos esta batalha”, afirma Alice Portugal.

Nesta quinta-feira (27), os deputados voltarão a discutir outras propostas de financiamento de campanhas, como a que permite a doação apenas de pessoas físicas. Se esse item também não conseguir 308 votos, ainda poderá ser analisada emenda que propõe o financiamento público exclusivo. Em caso de nova rejeição, permanecem em vigor as regras atuais. Nesse sentido, os olhos se voltam, novamente, ao Supremo Tribunal Federal (STF), que também está julgando a proibição de doações de empresas, e poderá enterrar de vez o assunto.

Com a derrota do tema na Câmara, não há mais motivos para que o ministro Gilmar Mendes continue a segurar a matéria. Desde abril de 2014, Mendes pediu vistas, mesmo tendo seis dos 11 votos favoráveis ao fim da prática no país. A medida deu tempo para o presidente da Câmara, deputado Eduardo Cunha (PMDB-RJ), correr com a aprovação de uma emenda constitucional sobre esse tipo de financiamento, mas não adiantou.

“Agora, vamos tentar introduzir o financiamento democrático na Constituição. Isso moralizaria o processo eleitoral e é uma proposta encabeçada pelo PCdoB”, afirma o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP), vice-líder do governo na Câmara.

Sistema eleitoral

A mudança no sistema eleitoral brasileiro também esteve na pauta da primeira noite de votação. A ideia era mudar o sistema proporcional, atualmente em vigor, para o chamado “distritão”, onde apenas os mais votados são eleitos. A proposta foi rejeitada por 267 votos a 210 e 5 abstenções.

Apesar de ser contrária à proposta do “distritão”, a bancada comunista, numa estratégia de votação, apoiou o texto. Em nota divulgada nesta quarta-feira, os parlamentares explicam que sua iniciativa foi motivada para impedir o avanço da proposta do financiamento empresarial e de cláusulas de barreira, que impediriam a pluralidade de vozes no Parlamento.

“Optamos pelo acordo de voto a favor do “distritão” para, em contrapartida, defender a sobrevivência no Parlamento não apenas do PCdoB, mas de todos os partidos de matizes ideológicas e que possuem profunda relação com a representação popular e com histórico de luta democrática e que não se configuram legenda de aluguel. Estes partidos têm história e identidade no Brasil e não podem se transformar em sublegenda de partidos grandes”, descreve o texto. 

Os debates sobre a reforma política ainda devem se estender até esta quinta-feira na Câmara. Os parlamentares devem discutir a doação para partidos (que continuariam repassando recursos para os candidatos), o financiamento público, bem como o fim da reeleição, a unificação das eleições, entre outras propostas.