Uma reportagem na edição de agosto da revista "Piauí" revela que em uma reunião ministerial, o presidente Jair Bolsonaro anunciou que iria intervir no Supremo Tribunal Federal (STF) com o uso das Forças Armadas e destituir os ministros da Corte. O novo arroubo golpista ocorreu em 22 de maio, quando ficou sabendo que o ministro Celso de Mello tinha feito uma consulta à Procuradoria-Geral da República (PGR) para saber se deveria ou não determinar a apreensão de seu celular e de seu filho, o vereador Carlos Bolsonaro (Republicanos-RJ).

Segundo a reportagem, a intenção do presidente era substituir os onze ministros do Supremo por militares ou civis nomeados por ele, que ficariam no cargo por tempo indeterminado “até que aquilo esteja em ordem”. "Vou intervir!", teria esbravejado Bolsonaro por duas vezes durante a reunião.

A consulta de Celso de Mello à PGR fazia parte de um procedimento de praxe na Corte, para atender a uma notícia-crime apresentada por três partidos. Bolsonaro, no entanto, estava transtornado com a possibilidade de ter seu celular apreendido e disse que não entregaria o aparelho, ainda que isso se configurasse descumprimento de uma decisão judicial.

A líder do PCdoB na Câmara, deputada Perpétua Almeida (AC), afirmou que o episódio demonstra como o atual presidente da República não entendeu até hoje qual é o papel das Forças Armadas, que são instituições nacionais, permanentes e regulares cuja missão constitucional é zelar pela defesa da Pátria.

"Se entendesse, não insistiria em tentar envolvê-las na lambança dele. Elas são instituições de Estado, que estão a serviço do País e não a serviço das vontades de governos. Principalmente daqueles que querem ficar dando golpes utilizando as Forças Armadas", pontuou a líder.

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) disse no Twitter que a "decisão" de intervir no STF "mostra que Bolsonaro se acha com poderes de Suserano no grande feudo chamado Brasil". O parlamentar acrescentou que o presidente possui uma "mentalidade tacanha, despótica, hostil à democracia".

Ele também ironizou a suposta mudança de postura do mandatário, que teria adotado um discurso mais moderado depois da prisão de Fabrício Queiroz e o aprofundamento das investigações contra atos de improbidade envolvendo seu governo e os familiares. "Não existe Bolsonaro 'paz e amor', é um jagunço na presidência", assinalou Orlando Silva.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) usou suas redes sociais para condenar mais um ímpeto golpista do presidente. "A Piauí de agosto trouxe uma apuração que revelou as entranhas do núcleo palaciano sobre querer INTERVIR NO STF. Se as informações se comprovarem, estamos diante de um Governo que namora a possibilidade de impor um regime autoritário no Brasil", escreveu.

"Gravíssimo! Aspirante a ditador merece total repúdio", declarou o deputado Márcio Jerry (PCdoB-MA).

Para o deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), Bolsonaro "nunca soube construir um governo que merecesse respeito do povo e de outros governos". "Sabe que suas decisões são extremamente absurdas e por isso quer usar a força bruta para conseguir o que quer", disse.

Recuo

A reportagem de "Piauí" relata que a reunião que tratou da intervenção no Supremo teve a presença dos ministros Luiz Eduardo Ramos (Secretaria de Governo), Augusto Heleno (Gabinete de Segurança Institucional) e Walter Braga Neto (Casa Civil). Os ministros André Mendonça (Justiça) e Fernando Azevedo (Defesa), e José Levi, advogado-geral da União, também teriam sido consultados sobre a intervenção e como dar legalidade ao ato autoritário, por meio do artigo 142 da Constituição.

Bolsonaro teria mudado seus planos depois que o general Augusto Heleno tentou contemporizar a situação e teria dito ao presidente: "Não é o momento para isso”.

Apreensão

Após manifestação contrária da PGR, o ministro Celso de Mello arquivou o pedido de apreensão dos celulares. Na decisão, o decano do STF fez questão de reafirmar a posição da Corte “neste singular momento em que o Brasil enfrenta gravíssimos desafios”.

"O Supremo Tribunal Federal, atento à sua alta responsabilidade institucional, não transigirá nem renunciará ao desempenho isento e impessoal da jurisdição, fazendo sempre prevalecer os valores fundantes da ordem democrática e prestando incondicional reverência ao primado da Constituição, ao império das leis e à superioridade político-jurídica das ideias que informam e que animam o espírito da República”, disse.

O ministro também fez questão de mandar um recado ao presidente, dizendo que o descumprimento de uma ordem judicial “configuraria gravíssimo comportamento transgressor”.