Desde sua implementação, a internet foi responsável por ampliar as formas de acesso à informação e estimular a troca de conhecimento. O que antes era de difícil alcance, hoje é resolvido em um clique. Livros que estavam disponíveis apenas em bibliotecas e nas casas de quem os havia adquirido, hoje circulam pelas redes em um crescente movimento de estímulo ao saber.

As novas práticas mudaram também o modo de encarar o aprendizado. É preciso que haja aperfeiçoamento e uma modernização no modo de conduzir a educação – não só no Brasil, mas no panorama mundial. Essas diretrizes foram tema central de discussão no Seminário Internacional de Recursos Educacionais Abertos (REA), realizado nesta quarta-feira (19) na Câmara dos Deputados. A iniciativa veio a partir da líder do PCdoB na Casa, Jandira Feghali (RJ), e do deputado Aliel Machado (PCdoB-PR), nas comissões de Educação e Cultura.

Por definição da Unesco, consideram-se Recursos Educacionais Abertos materiais de ensino, aprendizado e pesquisa em qualquer suporte ou mídia que estão sob domínio público ou são licenciados de maneira aberta, permitindo que sejam acessados, utilizados, adaptados e redistribuídos por terceiros.

Jandira destacou o avanço de se estar discutindo o assunto em um momento tão difícil da Câmara, onde muitas pautas retrógradas vêm à tona. “Às vezes tenho a sensação de que estou caminhando para a Idade Média. Mas ao participar de um seminário desses, vejo que vou em direção ao nosso futuro. Não há possibilidade de nenhum protagonismo cidadão sem o conhecimento, sem informação, sem o compartilhamento e sem a integração em rede do saber. Esse é o século XXI, e o REA é um instrumento que une tudo isso”, relatou Jandira na mesa de abertura do evento.

O deputado Aliel Machado destacou a importância das novas ferramentas para a educação. “A questão principal levantada aqui é a necessidade de fomentar esse debate, para que ele atinja as diversas camadas da sociedade: no âmbito legislativo, nas escolas, nas universidades. É preciso encontrar formas de qualificar o aprendizado, e essa é a principal ferramenta para isso.”

O seminário reuniu diversos participantes, muitos deles protagonistas de movimentos que disponibilizam e estimulam o uso de recursos educacionais abertos. Carolina Rossini, criadora do Projeto REA.br e vice-presidente da Public Knowledge, entidade sem fins lucrativos que defende o compartilhamento de conteúdos na internet, integrou uma das mesas e explicou o funcionamento do conceito, apresentando exemplos do mundo inteiro.

“As cinco liberdades mínimas dos REA, os ‘cinco Rs’, são as permissões concedidas aos usuários que acessam o recurso. Você precisa Reter, Reutilizar, Remixar, Revisar e Redistribuir. A ideia é que utilizemos a licença mais aberta possível, para maximizar o alcance e a circulação dos materiais”, esclareceu Carolina.

Os ministérios da Educação, da Cultura e da Justiça também foram representados no evento, e se mostraram abertos à iniciativa. Juana Nunes, da Secretaria de Educação e Formação Artística e Cultural (Sefac/MEC), salientou o poder de mudança desses recursos. “É preciso transformar a educação. O professor deve deixar de ser o detentor da informação para que haja um processo educacional colaborativo com os alunos, um aprendizado conjunto. É a cultura da democracia do conhecimento.”

Recursos Educacionais Abertos no exterior

O uso desse tipo de conteúdo na educação esbarra em dúvidas legais na área de direitos autorais, o que tem sido resolvido em diversas partes do mundo por meio de licenças elaboradas pela entidade sem fins lucrativos Creative Commons, criada nos Estados Unidos para permitir maior flexibilidade na utilização de obras protegidas por direitos autorais, dentro do espírito de compartilhamento e de colaboração da internet.

Hal Plotkin, consultor de políticas abertas da organização, compareceu ao seminário na Câmara. Ele deu uma palestra magna para os participantes sobre sua experiência, e indicou pontos de extrema relevância a serem considerados para a instalação de uma iniciativa nesse sentido.

“Esse é um mecanismo legal para licenciar o desejo de disponibilizar conteúdo educacional. Quando começamos o Creative, ouvi uma grande pergunta: ‘Quem vai ceder seu material gratuitamente, depois de ter tido tanto trabalho para fazer?’. Mais de um bilhão de licenças hoje mostram que há procura, que há uma grande demanda de educadores em busca de, efetivamente, educar.”

Jan Gondol, pesquisador, professor e consultor em políticas públicas de recursos na Eslováquia, também participou do debate e salientou o alcance da população no Brasil. “Eu abri e li alguns trechos da Constituição brasileira. Cheguei a me arrepiar. O direito à informação está no mesmo texto do direito à vida. É direito de vocês saber o que está acontecendo, vocês precisam usar a tecnologia disponível para que isso aconteça.” 

Projetos em tramitação na Câmara

Para permitir o uso de REA no Brasil, a deputada Jandira Feghali e os participantes do seminário defenderam a aprovação do Projeto de Lei (PL) 1513/11, do deputado Paulo Teixeira (PT-SP).

A proposta define o que são esses recursos e estabelece obrigações do governo na hora de comprar material didático e disponibilizá-lo para a população. O projeto está em tramitação na Comissão de Cultura.

“A ideia é que os autores concordem em conceder as licenças para o governo federal, que tem vários graus: pode ser total ou não, pode ter algum custo para alguns tipos de licença, mas que permita o uso amplo e irrestrito em toda a rede educacional brasileira”, explicou a líder do PCdoB na Câmara.