Para relembrar os 36 anos da Lei de Anistia e debater questões ligadas aos direitos humanos, a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça (MJ) organizou um evento com mais de 50 atividades em todo o Brasil. A Semana da Anistia, que acontece entre segunda-feira (24) e domingo, conta com uma programação repleta de palestras, seminários, oficinas, apresentações musicais, exibição de filmes e exposições fotográficas. A agenda foi montada pela comissão e por órgãos, entidades e organizações parceiras.

Na abertura da Semana, a deputada federal Jô Moraes (PCdoB-MG) encontrou-se com 40 camponeses, dentre os quais vítimas, viúvas e filhos de perseguidos pelas Forças Armadas entre 1968 e 1974, durante a guerrilha do Araguaia. Eles estão em Brasília para acompanhar o julgamento de pedidos de anistia de vítimas de repressão que datam do período.

Na manhã desta terça-feira (25), a Comissão de Anistia do Ministério da Justiça julgou 187 casos. Do total, 30 foram deferidos, e garantem aos anistiados reparação econômica. Entre os que não foram aprovados, há casos em que a Comissão entendeu que ainda não tinha condições de julgar. Além disso, ainda cabe recurso aos indeferidos.

O deputado Chico Lopes (PCdoB-CE) esteve presente para acompanhar o andamento dos casos. “Tenho certeza de que os companheiros que sofreram perseguição pelo regime militar naquela época serão anistiados e recompensados pela sua luta para que o país chegasse à democracia que nós temos hoje”, ressaltou.

Segundo Sezostrys Alves da Costa, presidente da Associação dos Torturados da Guerrilha do Araguaia (ATGA), e secretário de Saúde da cidade de Palestina do Pará, a reparação concedida pela Comissão tem sido uma prestação mensal continuada de dois salários mínimos, mais um retroativo considerando o tempo de perseguição sofrida e de tramitação do processo. A concessão de reparação teve inicio em 2002 e, desde então, a entidade vem dando entrada nos requerimentos.

Atrocidades

A reparação é concedida após estudos e análises da Comissão de Anistia com base na Lei 10.559/02, que prevê o pagamento àqueles que foram impedidos de continuar sua atividade laboral. “Estes camponeses viviam da terra, tiravam seus sustentos da lavoura quando foram cruelmente torturados, perseguidos, sofrendo diversos tipos de atrocidades durante o conflito armado nos sertões araguaianos”, relata Sezostrys. Ele tem ajudado os camponeses e seus familiares que “hoje vivem as sequelas daquele período numa situação de alto índice de vulnerabilidade social”.

A deputada Jô Moraes salientou a presença de um grande número de mulheres no auditório do Ministério da Justiça. “São viúvas e filhas de vítimas que apesar das dificuldades puderam se deslocar até aqui. A maioria veio de Palmas, Parintins do Pará, São Domingos do Araguaia, Marabá, São João do Araguaia, Redenção e São Geraldo”.

Liminar

Os levantamentos para os processos de indenização envolvendo as vítimas da guerrilha do Araguaia tiveram início em 2009, com a visita da Comissão da Anistia e do ex-ministro da Justiça Tarso Genro à região. “Foi quando deram início ao pagamento de 44 indenizações de camponeses. Logo em seguida, sofremos uma ação da Justiça Federal do Rio de Janeiro, provocada pelo Bolsonaro (deputado Jair Messias Bolsonaro). Eles conseguiram suspender liminarmente, por dois anos e meio, os pagamentos das indenizações aos camponeses”, relata o dirigente da ATGA.

Para reverter a decisão e reestabelecer o pagamento aos anistiados, os entendimentos envolveram a Ordem dos Advogados do Brasil (OAB), o PCdoB e várias articulações.  “Infelizmente, neste período, alguns que tinham sido anistiados em 2009 faleceram no decorrer do processo e não receberam. Depois disso, aconteceram dois julgamentos com um número bem menor de vítimas. Os que sofreram as ações do Rio de Janeiro só começaram a receber em 2012, mas retroativamente”, explicou Sezostrys.

LGBT

Além de participar da solenidade de abertura da Semana da Anistia no Ministério da Justiça, a deputada Jô Moraes homenageou Sandra Maria Carnio, vítima da repressão na ditadura por sua posição em defesa dos direitos LGBT. Sandra enfrentou o cativeiro por 12 dias e foi anistiada em março. A homenagem integra a programação da 20ª edição da Anistia Cultural do Ministério da Justiça, dentro das atividades do evento “Repressão à Homossexualidade da Ditadura e a Homofobia na Democracia”.

Além de Sandra Maria Carnio, também foram homenageados a ativista Maria Fernandes, do Coletivo de Feministas Lésbicas de São Paulo, e o historiador James Green, professor da Universidade Brown (Estados Unidos), cujos estudos sobre Ditadura e homossexualidade influenciaram o relatório final da Comissão Nacional da Verdade.