As eleições de 2018 registraram o melhor resultado para a representação feminina na Câmara dos Deputados, com 77 eleitas. O número é fruto da luta pelo aumento da participação feminina na política, que garantiu, em lei, a presença mínima de 30% de mulheres na formação das chapas para cargos legislativos. Outro fator para o início da mudança no perfil legislativo foi a decisão da Justiça Eleitoral de que os partidos devem destinar 30% do Fundo Especial de Financiamento de Campanhas para as candidaturas femininas.

Os avanços, no entanto, vêm sendo atacados no Parlamento. E a mais nova ameaça vem do Projeto de Lei (PL) 2996/2019, apresentado pela deputada Renata Abreu (Podemos-SP), que pretende acabar com a obrigatoriedade de 30% de candidaturas femininas, e, consequentemente, com a aplicação do percentual mínimo de financiamento das campanhas. O texto, que tramita com prioridade na Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania da Câmara, teve um pedido de vista coletivo no dia 10 de julho e, posteriormente, foi devolvido à relatora, deputada Bia Kicis (PSL-DF), que é favorável à admissibilidade da matéria.

O tema foi trazido à pauta esta semana pela deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), em discurso no Plenário da Câmara. Para ela, o momento é de avanços e não de retrocessos.

“Nós conquistamos um avanço extraordinário. Nunca se elegeu tantas mulheres como agora, exatamente pela política de cotas e pela decisão de investimento financeiro nas candidaturas femininas. Agora vamos retroagir? Não podemos aceitar. Não podemos aceitar que este seja um Parlamento de homens. Precisamos de mais e mais mulheres. Não há democracia nesse país se não houver mais participação das mulheres no Congresso”, alertou a parlamentar.

Perpétua citou ainda um parecer jurídico da ONG Visibilidade Feminina, que se posiciona de maneira contrária ao PL 2996/2019. De acordo com a instituição, a proposta representa “um retrocesso para as conquistas das mulheres” e vai na contramão “de todas as recomendações internacionais e do caminho bem-sucedido dos países que se aproximam da igualdade de gênero de fato na política”.

“A mudança legislativa proposta no projeto de lei relega às cotas um papel meramente simbólico e sem efetividade, como legislação decorativa para responder formalmente às pressões globais e locais pela adoção de políticas públicas de inclusão feminina, e não meios de transformação da realidade e combate à desigualdade. (…) A adoção de políticas efetivas para inclusão da mulher e promoção de reconhecimento, além de contribuir para melhorar a qualidade de nossa democracia, é capaz de promover mudança no comportamento social, tornando-o menos violento e discriminatório”, pontua o documento da ONG.

Em todo o mundo, o sistema de cotas contribuiu para a redução da diferença entre a representação política feminina e a masculina. Na América Latina, México e Argentina já introduziram a paridade, de tal forma que 50% das candidatas listadas têm de ser mulheres. Enquanto o México, com 48,2% de representação feminina no Parlamento, ocupa a 4ª posição no ranking de 192 países da Inter-Parliamentary Union, a Argentina, com 38,8% de mulheres no Legislativo, está na 19ª colocação. Já o Brasil, com 15% de mulheres no parlamento, divide a 133ª posição com o Bahrein e Paraguai, atrás da Jordânia na 131ª posição e da Líbia, na 128ª, por exemplo.