O Plenário aprovou nesta terça-feira (9) a chamada PEC Emergencial (Proposta de Emenda à Constituição 186/19), que ficou conhecida como “PEC do arrocho”. O texto cria mais um ajuste fiscal, que terá caráter permanente, para privilegiar e priorizar os gastos financeiros do governo federal pelos próximos anos.

Como a Comissão de Constituição e Justiça e de Cidadania (CCJ) ainda não foi instalada, o deputado Daniel Freitas (PSL-SC) foi o relator de Plenário. Em seu parecer, ele atendeu todas as exigências feitas pela equipe econômica do presidente Jair Bolsonaro para a volta do auxílio emergencial.

O texto impõe a aplicação de mais medidas de arrocho fiscal e o controle de despesas com pessoal. Ou seja, todas as despesas relacionadas à cidadania, aos direitos sociais e a todas as políticas públicas ficam subordinadas a um conceito genérico de “sustentabilidade da dívida”.

A PEC cria restrições mais severas que as estabelecidas atualmente pelo teto de gastos da União. Essas medidas proíbem expansão de gastos de pessoal, benefícios tributários, expansão dos créditos públicos que impliquem incentivos ou benefícios e aumento de despesas obrigatórias. Também extingue vários fundos constitucionais e veda a criação de novos fundos.

Em troca destas medidas, após a promulgação da matéria o governo vai editar uma medida provisória solicitando crédito extraordinário para que um auxílio de R$ 250,00 seja pago de março até junho. Para quem mora sozinho o benefício deve ser de R$ 175,00 e para mães solteiras, o valor pode ser de R$ 375,00. A proposta limita ainda a R$ 44 bilhões em 2021 o montante de gastos para pagar um auxílio emergencial, o que reduz pela metade o número de pessoas aptas a receber as quatro parcelas.

O líder do PCdoB na Câmara, deputado Renildo Calheiros (PE), ressaltou que o PCdoB é a favor da retomada imediata do auxílio emergencial, com o mesmo valor da primeira versão (R$ 600,00).

Ele rechaçou, entretanto, a manobra do governo de incluir o auxílio na PEC Emergencial, entre outros motivos porque ela "esvazia os institutos de pesquisa e tecnologia e massacra os servidores públicos da área de saúde". "O governo coloca esta Casa diante de um grande dilema: quer juntar em uma mesma PEC alhos e bugalhos. Coloca dentro de uma mesma PEC assuntos que não conversam entre si: o auxílio emergencial e um ajuste fiscal. São coisas que não combinam. É uma manobra, uma chantagem contra o Congresso e mais uma tentativa de confundir a opinião pública, de fazer parecer que estão contra o auxílio emergencial aqueles que na verdade lutam contra o abuso do ajuste fiscal que o governo está pretendendo", afirmou.

Ao obstruir a votação da PEC Emergencial, os partidos de oposição reforçaram que o governo promove uma chantagem política ao vincular a votação da proposta à aprovação do auxílio emergencial. Renildo observou que propostas de ajuste fiscal não devem ser discutidas neste momento, quando o Brasil atravessa a fase mais aguda da crise sanitária gerada pela pandemia de Covid-19.

Fatiamento

O parlamentar lembrou que o PCdoB apresentou um projeto que estabelece o auxílio emergencial, que poderia ser colocado em votação para socorrer os mais necessitados e dinamizar a economia sem comprometer recursos destinados à saúde e educação. "O auxílio emergencial movimenta as feiras, os supermercados, as padarias, as farmácias e o comércio de maneira geral. Foi ele o principal responsável pela economia brasileira não ter caído ainda mais do que caiu, não ter mergulhado ainda mais do que mergulhou", disse.

A vice-líder da Bancada, deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), também defendeu separar o auxílio emergencial da proposta do governo, chamada por ela de "PEC do fim do mundo". "O governo quer desmontar todo o serviço público do Brasil na área da saúde, da educação, da segurança pública e até do Judiciário", denunciou a parlamentar.

Para o deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), o Brasil precisa neste momento é da aprovação de medidas de proteção à vida, dos direitos sociais, dos trabalhadores e da atividade produtiva impactada pelos efeitos do avanço do coronavírus. "Na verdade, essa PEC é um grande engodo, uma farsa! E não tem o objetivo de restabelecer, como estão dizendo, a renda emergencial", observou.

"É preciso também resgatar as ações que protegem o emprego. Muitas empresas não estão suportando mais. Aquelas medidas de proteção do emprego já não estão mais em vigência, é preciso resgatá-las imediatamente, rapidamente. Também é necessário resgatar as medidas adotadas para assegurar o acesso ao crédito, especialmente a proteção dos pequenos e médios empresários, particularmente dos setores de serviços, que são os que mais estão sendo afetados", defendeu o parlamentar.

Ao analisar os efeitos da PEC, a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) sublinhou que o texto é uma proposta dois em um, em matéria de injustiça: "É um pacote fiscal parceiro da Emenda Constitucional nº 95 (teto de gastos), um pacote fiscal inadequado. Paulo Guedes não sabe o que diz. Ele tem que saber que, neste momento, ajustes fiscais com essa natureza fiscalista, reducionista do tamanho do Estado, saiu de moda. No mundo inteiro está se colocando dinheiro na mão do povo, aumentando despesas do Estado, para fazer a economia girar".

Alternativa

Segundo a deputada Professora Marcivânia (PCdoB-AP), existem outros mecanismos legislativos para criar um auxílio emergencial que atenda as necessidades atuais da população brasileira. "Existe essa questão financeira, que precisa ser considerada. Mas nós temos alternativas, sim, e precisamos lançar mão delas, como tributar os grandes investimentos, as grandes fortunas. É preciso que esta Casa tenha sensibilidade neste momento difícil por que o Brasil está passando, além de tudo, às pessoas mais vulneráveis", pontuou.

Na mesma linha, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) destacou que frente ao drama que o Brasil vive, a Câmara dos Deputados não pode "entregar o auxílio emergencial com uma mão e retirar com a outra". "Quando se estabelece um teto orçamentário, isso é de uma crueldade, de uma insensibilidade com a dor, com a fome, com o desemprego, com a tristeza que atinge o nosso povo. É necessário, no mínimo, restabelecer o auxílio emergencial de 600 reais. O PCdoB defende restabelecer o auxílio emergencial pelo período que for necessário, enquanto durar a pandemia", frisou.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) advertiu que a aprovação da PEC pode impedir, por exemplo, que Estados, Municípios e União possam fazer novas contratações de profissionais de saúde, professores, policiais e assistentes sociais.

"A pergunta que fica é: nós estamos precisando de mais ou de menos médicos, de mais ou de menos auxiliares e técnicos de enfermagem? Nós estamos precisando de mais ou de menos assistentes sociais, de mais ou de menos agentes de segurança? Nós estamos precisando aumentar ou diminuir as despesas com saúde e educação? Nós precisamos extinguir o Fundo de Cultura?", indagou. "Nós estamos extinguindo o Fundo Social do Pré-Sal, que tem um percentual importante para a educação pública brasileira. Nós estamos extinguindo o Fundo de Meio Ambiente. Nós estamos extinguindo o Fundo para Infância e Adolescência. Nós estamos extinguindo instrumentos estratégicos do Estado brasileiro", alertou.

Tramitação

Aprovada na quinta-feira passada (4) pelo Senado, essa matéria ainda precisa passar pela Câmara em dois turnos de votação.