Na semana passada, a extrema direita brasileira deu mais uma prova de seu completo descompromisso com o Brasil e os interesses do povo brasileiro. Enquanto o mundo aguardava com apreensão o anúncio do “tarifaço” de Donald Trump — medida que leva incerteza à economia global e pode jogar o mundo em uma crise de dimensões ainda imprevisíveis —, Jair Bolsonaro e sua turma de lambe-botas entupiam as redes com mensagens de apoio descerebrado a esta peça mal acabada de neocolonialismo ianque. Enquanto o Parlamento brasileiro se unia em defesa da soberania nacional e aprovava a Lei da Reciprocidade, os extremistas faziam discursos pregando a subserviência mais indigna aos EUA, de olho em algum tipo de apoio a seu absurdo projeto de anistia aos extremistas do 8 de Janeiro. Seu falso patriotismo foi exposto em praça pública. Suas intenções nunca foram tão claras.

Bolsonaro acredita que, se for totalmente subserviente a Trump e Elon Musk, os EUA irão livrá-lo de encarar seus crimes contra a democracia brasileira. Ao apoiar de maneira irrestrita o tarifaço, o encrencado e inelegível ex-presidente acabou por confessar um complexo de vira-latas capaz de chocar até mesmo Nelson Rodrigues. Revelou também seu desespero: nunca é demais lembrar que, numa decisão histórica e inédita do Judiciário brasileiro, o ex-presidente foi tornado réu em março por sua liderança no processo golpista, ao lado de militares de alta patente, como Braga Netto, Augusto Heleno, Almir Garnier e Paulo Sérgio Nogueira.

Apesar de não fazer sentido economicamente, pois pode levar os próprios EUA a um cenário de inflação e recessão, a medida de Trump não é, nem de longe, impensada. É um ataque às relações comerciais multilaterais entre as nações, especialmente os emergentes acordos regionais do Sul Global liderados pelos países do BRICS, que avançam também nos debates sobre a desdolarização das transações, e uma tentativa de compensar o déficit interno estadunidense sobretaxando importações. Um resumo do “make America great again”: torcer o braço de seus parceiros comerciais para trazer de volta os empregos que o próprio neoliberalismo norte-americano mandou para a Ásia nos anos 1980 e 1990.

Absurdo ainda maior do que o tarifaço foi ver os extremistas brasileiros, que sempre se disseram paladinos radicais do livre comércio, defenderem o novo protecionismo dos EUA. E tentarem obstruir a aprovação da Lei da Reciprocidade — ironicamente, relatada pela senadora Tereza Cristina, ex-ministra da Agricultura do governo Bolsonaro. Sem sucesso: foram 361 votos a 10 a favor da urgência. O mérito foi votado por acordo e de forma simbólica depois de serem desmascarados.

A realidade é que taxas menores para o Brasil decorrem da ação do governo brasileiro, que passou as últimas semanas negociando com o governo estadunidense para tentar reverter medidas que possam trazer desequilíbrio às relações comerciais entre os dois países. Segundo o Itamaraty, o Brasil fornece o terceiro maior superávit comercial dos EUA em todo o mundo: em 2024, foram 28,6 bilhões de dólares em bens e serviços. A Lei da Reciprocidade nada mais é do que uma justa proteção aos interesses brasileiros nas relações bilaterais com a maior economia do mundo. E deixa duas lições.

A primeira: o Congresso ainda consegue se reunir em torno de grandes pautas de interesse nacional, acima de intenções obscuras e sabotagens. Fizemos agora com as tarifas, e precisamos fazer na aprovação à isenção do Imposto de Renda com taxação de grandes fortunas e na redução de escala de trabalho 6×1, dois temas com grande força popular que irão tramitar este ano no Legislativo.

A outra lição é que a resposta do bolsonarismo às grandes questões brasileiras continua a ser a mesma: a covardia e a submissão a outros interesses, que não os do povo brasileiro. Foi assim que lidaram com a pandemia, uma omissão criminosa que resultou em 700 mil mortes e ainda carece de justiça. Foi assim após a derrota nas urnas, com uma tentativa de golpe que enviou centenas de cúmplices às prisões enquanto Jair Bolsonaro fugia para Miami. E foi assim também agora, quando, diante das ameaças norte-americanas, tudo o que a extrema-direita soube dizer foi, em resumo, “aceita que dói menos”. Mas jamais iremos aceitar acordos que sejam ruins para o Brasil, assim como não permitimos que golpistas fiquem impunes. Estejamos atentos para as oportunidades que a crise projetada pelos EUA poderá nos trazer: o mundo é multipolar e o Sul Global está desperto!

*Jandira Feghali é deputada federal pelo PCdoB do Rio de Janeiro. Artigo originalmente publicado na Carta Capital.