Ameaças não vão me calar: A resistência de uma mulher negra, lésbica e gaúcha na política
Eu não vou sucumbir. A violência política contra mulheres é uma realidade cruel e inaceitável no Brasil. Na manhã desta terça-feira (20) fui alvo de mais uma ameaça de morte. Desta vez, recebi um e-mail com uma mensagem que tem o racismo e a misoginia como motivadores principais do crime. Em agosto do ano passado, também fui ameaçada por criminosos que, naquela ocasião, me atacaram por ser uma mulher lésbica.
Em menos de dois anos como deputada federal, fui considerada uma parlamentar em ascensão de acordo com o Departamento Intersindical de Assessoria Parlamentar (DIAP), que reúne os deputados e as deputadas que mais se destacam no Brasil. Sou presidenta da Comissão dos Direitos Humanos e coordenadora do eixo da Violência Observatório Nacional da Mulher na Política, também integro a Comissão de Ciência e de Tecnologia.
Nesta última ameaça, o criminoso afirma que eu “jamais serei reconhecida como uma cidadã legítima do RS”, onde “a grande maioria da população é branca”. E segue, descrevendo o “perfil” de parlamentar que ele gostaria de assassinar: “macaco”, “sapatona”, “nordestino” ou “homossexual”.
Ou seja, ser quem eu sou e ocupar os espaços que eu ocupo incomoda profundamente aqueles que sonham em manter um ambiente monolítico na política, composto apenas por homens brancos e heterossexuais. Entretanto, as ameaças não irão me silenciar e nem me paralisar.
Esses episódios reforçam a importância de termos mais mulheres, sobretudo as negras, nos espaços de poder. Precisamos também ampliar a participação de pessoas LGBTI+. A representatividade, quando atrelada ao compromisso com os direitos humanos e a justiça social, de fato, resulta na construção de políticas públicas que mudam a sociedade. É exatamente isso que esses criminosos covardes não querem.
A ameaça que recebi no ano passado ocorreu em meio ao Mês da Visibilidade Lésbica. Neste ano, o conteúdo ameaçador foi enviado no mesmo mês, mas em um período ainda mais relevante: as eleições para prefeitos, vice-prefeitos e vereadores. Não há coincidência e é isso que os dados demonstram.
Segundo dados do Tribunal Superior Eleitoral (TSE), o percentual de candidatos negros (soma de pretos e pardos) é o maior das últimas três campanhas. Entre aqueles que estão se candidatando a prefeitos, vice-prefeitos e vereadores, 52,73% se declaram negros. Em 2020, esse total foi de 50,02% e em 2016, de 47,75%.
Este é o primeiro ano em que os candidatos puderam divulgar sua orientação sexual à Justiça Eleitoral. Essa é uma conquista dos parlamentares LGBTI+, que nos mobilizamos para que isso se tornasse realidade. Ao menos, 2.396 pessoas LGBTI+ participaram das eleições: 1.037 gays, 644 lésbicas, 452 bissexuais, 191 assexuais e 72 pansexuais.
Esses números mostram que estamos rompendo barreiras históricas e ocupando espaços que sempre nos foram negados. Esse crescimento desperta a ira de quem sempre nos odiou e nunca quis nossa ascensão social. Mas estamos cada vez mais presentes no processo eleitoral, e nada nos deterá.
Medidas legais já foram adotadas em relação ao criminoso. Na tarde desta terça-feira (20), registrei um boletim de ocorrência na Delegacia da Polícia Legislativa da Câmara Federal, em Brasília (DF). Seguirei de cabeça erguida exercendo o meu trabalho sempre comprometida com todas as pessoas que me confiaram o seu voto.
Não permitiremos que o medo nos silencie. Continuarei lutando por uma política mais inclusiva, com equidade, sem racismo e justa, onde todas possamos ter voz e vez.