Há situações na vida política, particularmente nos momentos de crise, em que os passos devem ser muito bem calculados, pois movimentos aparentemente corretos podem embutir riscos indesejáveis. O limiar entre a demonstração de força e de fraqueza, às vezes, é bem estreito.

Bolsonaro e seus apoiadores realizaram neste domingo 16, em Copacabana, um ato político em apoio à anistia para os golpistas de 8 de Janeiro, pretexto “humanista” utilizado pelo ex-presidente para buscar a própria impunidade. Fizeram de tudo: utilizaram seus poderosos instrumentos de redes sociais, convocação através de lideranças religiosas, recursos abundantes, esperando levar 1 milhão de pessoas à orla carioca – que já conta sempre com uma mobilização própria, diga-se.

As intenções eram muito claras: demonstrar apelo popular e força política, impulsionar a tramitação do projeto de lei sobre o tema no Congresso Nacional e intimidar o Supremo Tribunal Federal, que analisa o recebimento da denúncia feita pela Procuradoria Geral da República contra Bolsonaro no próximo dia 25.

Pois bem, aparentemente, o tiro saiu pela culatra. Não vou entrar aqui no debate de torcidas se “flopou” ou não, para usar a terminologia das redes. Até que tinha gente no ato, mais precisamente 18.300 pessoas, segundo a metodologia com maior grau de cientificidade de que dispomos, utilizada pela USP/CEBRAP – ou seja, 2% do proclamado por eles. O Datafolha foi mais generoso e apontou 30 mil.

A bandeira da anistia, empunhada de maneira tão oportunista, não é simples de ganhar a sociedade amplamente. A população assistiu ao vivo às estarrecedoras cenas de violência e depredação na Praça dos Três Poderes e todos se lembram do quanto Bolsonaro instigou a ruptura institucional. As últimas pesquisas de opinião sobre o tema demonstraram que a maioria da população é contrária ao perdão para aqueles que atentaram à democracia — 62%, segundo Datafolha de dezembro.

Quanto a presenças políticas, o ato também demonstra que há limites para o avanço da agenda. Estavam lá, segundo a mídia, os senadores Flávio Bolsonaro e Magno Malta e os governadores Mauro Mendes (MT), Jorginho Mello (SC), o anfitrião Cláudio Castro (RJ) e Tarcísio de Freitas (SP). Não furou a bolha.

A presença de Tarcísio, qualifique-se corretamente, é mais oportunismo eleitoreiro do que solidariedade.  O governador de São Paulo, embora diga publicamente desejar a volta do ex, nitidamente procura se viabilizar como herdeiro de seu espólio em 2026. Não à toa, foi o principal orador a criticar o governo Lula, deixando a Malafaia e outros a pancadaria contra o Supremo Tribunal Federal. É como se estivesse na missa de corpo presente de Bolsonaro.

Tudo somado, a pergunta que fica é: Bolsonaro e a luta pela impunidade aos golpistas, principalmente ele próprio, saíram fortalecidos de Copacabana? A resposta é não! A fotografia foi de capacidade de mobilização de massas declinante, com uma bandeira política que só aglutina a franja mais convertida do bolsonarismo. A impunidade para os golpistas não forma uma frente ampla.

*Orlando Silva é deputado federal pelo PCdoB de São Paulo. Artigo publicado originalmente na Carta Capital.