Guerra entre Rússia e Ucrânia pode gerar riscos para segurança alimentar
Elevação de preços e escassez de alimentos e combustíveis foram as principais consequências da guerra entre Rússia e Ucrânia apontadas por participantes de audiência pública na Câmara dos Deputados nesta terça-feira (31). O debate promovido pelas comissões de Desenvolvimento Econômico, Indústria, Comércio e Serviços e de Relações Exteriores e de Defesa Nacional reuniu representantes do governo, do setor produtivo e especialistas em geopolítica e comércio internacional.
Autora do pedido da audiência, a deputada Perpétua Almeida (PCdoB-AC), destacou a importância de se debater os impactos nas cadeias globais de valor e de suprimentos, já antes afetadas pela Covid-19.
“Precisamos entender os efeitos para o agronegócio brasileiro, seja em termos de insumos (fertilizantes), logística e mercados para exportação; as consequências na questão energética e a necessidade de aumento da produção de petróleo e gás no Brasil, bem como a abertura de novas frentes de exploração, como na margem equatorial brasileira”, observou Perpétua Almeida.
Segundo o secretário de Assuntos Multilaterais Políticos do Ministério das Relações Exteriores, embaixador Paulino Franco de Carvalho, o Brasil procura manter uma posição de neutralidade e aposta na solução diplomática para o pôr fim ao conflito. O embaixador criticou as sanções unilaterais impostas à Rússia, que podem colocar em risco a segurança alimentar de grande da população do planeta.
“Atingem produtos essenciais à sobrevivência de grande parte da população, como os fertilizantes de que nós no Brasil precisamos e são igualmente essenciais para garantir a segurança alimentar de países em desenvolvimento, que respondem por ¾ da população mundial”, alertou.
A representante da Confederação Nacional da Agricultura, Nathália Sampaio, apontou que o Brasil tem forte dependência da Rússia para importação de fertilizantes. E, por isso, o produto teve forte alta de preços no país em decorrência do conflito. O governo busca amenizar o problema com a busca de outros fornecedores, mas a medida tem se mostrado insuficiente.
Política industrial
O professor da Escola Superior de Guerra, Ronaldo Carmona, defendeu que o Brasil tem de investir na industrialização, a fim de garantir o abastecimento de produtos estratégicos, como combustíveis e fertilizantes.
Carmona acredita que a guerra é uma consequência de mudanças que já vêm ocorrendo na correlação de forças mundiais nas últimas décadas. “Todos os grandes países passam a considerar como prioridade o fator de segurança nacional no que diz respeito à obtenção de bens ou insumos críticos ou vitais. Essa é uma questão de que o Brasil, certamente, precisa tirar lições no sentido de reconstrução de sua capacidade industrial”, recomendou.
A falta de uma política industrial voltada para os interesses do País também foi alvo de críticas do professor de pós-graduação em Economia Política Internacional, da Universidade Federal do Rio de Janeiro, Raphael Padula. Ele afirma que a Petrobras, por exemplo, passou a ter uma gestão voltada para dar lucro aos acionistas e, não, para o abastecimento de combustíveis no mercado interno. Padula também culpa a gestão da estatal do petróleo brasileiro por não fazer investimentos na produção de insumos para fertilizantes.
O professor acredita que a solução para o problema pode estar em buscar novos parceiros comerciais e firmar parcerias no próprio continente sul-americano, onde há países com plantas ociosas que podem suprir a falta do produto provocada pela guerra no leste europeu. “O Brasil tem que buscar diversificar as importações com diferentes parceiros para não depender de um só país. E, ao diversificar as importações, buscar parceiros que são confiáveis do ponto de vista geopolítico, político e também logístico. Do ponto de vista de vizinhança, a gente tem um favorecimento logístico na América do Sul", disse.
Para Perpétua Almeida (PCdoB-AC), o Parlamento pode contribuir na busca por soluções diplomáticas para o conflito armado, que já dura mais de três meses.