A alteração no conceito de trabalho escravo (portaria 1.129/17) foi tema de audiência pública com o ministro Ronaldo Nogueira na manhã desta quarta-feira (6) na Comissão de Trabalho, de Administração e Serviço Público. A nova regra foi suspensa pelo Supremo Tribunal Federal (STF) em 24 de outubro por restringir a fiscalização e estar divorciada da realidade.

Segundo a portaria, características como "jornada exaustiva" e "condição degradante", para serem aceitas, dependeriam da privação da liberdade do trabalhador, o que, de acordo com os deputados que pediram a audiência, contraria o que diz o Código Penal.

Para a ministra Rosa Weber a redação é “restritiva” por estar distante da compreensão contemporânea sobre o trabalho escravo, “amparada na legislação penal vigente no país, em instrumentos internacionais dos quais o Brasil é signatário e na jurisprudência desta Suprema Corte”, argumentou no ato da suspensão da medida.

O presidente da Comissão do Trabalho, deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) criticou a portaria e afirmou que mais de 20 projetos de decretos legislativos foram elaborados para suspender o documento. “Não se trata de um caso eventual, um acontecimento fortuito. Algo que de repente apareceu num canto ou noutro. Trata-se de um fenômeno que existe na sociedade brasileira, e que por isso merece todo o cuidado, toda a atenção”, ressaltou Orlando.

Para o parlamentar o escravismo fez parte da formação histórica e social do Brasil e foi combatido por diferentes lideranças políticas. “Fernando Henrique Cardoso que criou um grupo de trabalho para combater esta prática foi responsável por cerca de seis mil resgates. Com o presidente Lula, entre 2003 e 2010, foram 33 mil resgates”, disse.

O ministro do Trabalho, Ronaldo Nogueira afirmou que o objetivo da portaria sobre o trabalho escravo era orientar processos na pasta e não impedir a fiscalização. "A portaria tema sua competência no âmbito do Ministério do Trabalho no sentido de dar ao auditor fiscal do trabalho direcionamento e melhorar a instrução nos processos administrativos", explicou durante audiência na Comissão do Trabalho da Câmara.

"Nossa intenção na elaboração da portaria era trazer para os autos do processo as respectivas provas, o registro do boletim de ocorrência para que no ato se instaure um processo criminal para que seja levada à responsabilização penal que têm esse comportamento inaceitável para o século XXI", completou Nogueira. De acordo com o ministro, quem submete uma pessoa à situação indigna laboral precisa ser responsabilizado criminalmente.

De acordo com Orlando Silva, a preocupação com é que o Código Penal Brasileiro foi modificado há pouco tempo para explicitar o que vem a ser condições análogas à escravidão. “Isto foi escrito na lei para evitar a subjetividade. Trata-se de um tema que o Brasil tem compromissos internacionais, tem uma trajetória e é uma referência internacional. E qualquer mecanismo que possa inibir o pleno cumprimento do necessário combate ao trabalho escravo esta Comissão tem de estar alerta”, criticou o presidente da Comissão do Trabalho.

O Ministério Público Federal e o Ministério Público do Trabalho também pediram a revogação da medida. E a Organização Internacional do Trabalho (OIT) disse que o texto ameaça interromper uma trajetória de sucesso que tornou o Brasil uma referência no combate ao trabalho escravo.

A Advocacia-Geral da União defendeu, nesta terça-feira (5), a portaria editada pelo governo Temer, salientando que o texto trouxe “maior clareza, objetividade e segurança jurídica” e tinha a intenção de considerar casos de “infrações trabalhistas menos gravosas”. Para o governo, a nova regra evita que ocorram “excessos na tipificação de condutas, os quais podem gerar sérios danos à imagem dos envolvidos”.

Portaria do trabalho escravo

De acordo com a portaria nº 1.129 de 2017, para ser considerada condição análoga à de escravo é preciso que o trabalhador esteja em condição de submissão "sob ameaça de punição, com uso de coação, realizado de maneira involuntária".  O texto gerou reações contrárias de entidades como a Organização Internacional do Trabalho (OIT), da Procuradoria-Geral da República (PGR) e do Conselho Nacional dos Direitos da Criança e do Adolescente (Conanda).

Com Agência Câmara