O Ministério da Educação (MEC) recuou e decidiu revogar a portaria que havia publicado nesta quarta-feira (2) determinando o retorno das aulas presenciais nas universidades e institutos federais a partir de janeiro. A decisão foi motivada pela repercussão negativa da medida. O recuo foi anunciado pelo ministro, Milton Ribeiro, à CNN. Segundo ele, uma consulta pública para ouvir o mundo acadêmico será aberta antes de tomar nova decisão.

A portaria havia sido publicada mais cedo, sem que o país contasse com qualquer plano de vacinação contra a Covid-19 ou mesmo uma vacina aprovada, num momento que o mundo vive nova alta de casos da doença. Só no Brasil já são mais de 173 mil mortes pelo coronavírus.

Diante do recuo, parlamentares que haviam criticado mais cedo a portaria comemoram o resultado da pressão.
“Vitória da Educação. MEC recua e vai revogar portaria que determina o retorno das aulas em universidades e institutos federais em janeiro. Havíamos apresentado um projeto para derrubar essa medida irresponsável. Vamos seguir em luta e vigilantes contra os retrocessos do governo”, comemorou a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA).

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) aproveitou a decisão para reforçar o descrédito do governo Bolsonaro. “Após ver que sua esdrúxula decisão de volta às aulas foi ignorada pelas principais universidades, o MEC teve que revogar a própria decisão”, destacou.

Esta não é a primeira vez que o governo Bolsonaro volta atrás de decisões publicadas, após rejeição de setores da sociedade. Mais cedo, diversas universidades haviam se manifestado contrariamente à portaria do MEC. A medida também teve repúdio de políticos e entidades estudantis.

O texto, publicado sem qualquer consulta à comunidade acadêmica, estabelecia a retomada das aulas presenciais em 4 de janeiro nas instituições de ensino superior, observando os cuidados recomendados pela Organização Mundial de Saúde (OMS).

Críticas

A portaria recebeu críticas dos parlamentares do PCdoB e de entidades estudantis que viram na decisão do governo mais um ato de irresponsabilidade.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) foi uma das que reagiu à decisão em suas redes sociais. “O MEC pressiona universidades para retorno às pressas para aula presencial em janeiro. Janeiro! Mal há estratégia de vacinação, vimos que mais de sete milhões de testes estão para vencer. Bolsonaro nem liga que estamos em pandemia e querem fazer o retorno de qualquer forma?”, indagou.

Alice e Orlando Silva também haviam se manifestado. Para Alice, a medida era “autoritária e descabida”. Já Orlando Silva havia apontado a irresponsabilidade do governo com a decisão diante do aumento de casos no Brasil.

A portaria também foi criticada por entidades ligadas à educação. A presidente da Associação Nacional de Pós-Graduandos (ANPG), Flávia Calé, afirmou que a entidade lutará para que “prevaleça a autonomia universitária e o planejamento das instituições, já em curso”.

A União Nacional dos Estudantes (UNE) também se posicionou contra a portaria. De acordo com a entidade, apesar das dificuldades enfrentadas pelas instituições para o estabelecimento ensino remoto, é preciso cuidar da vida em primeiro lugar.

“Somos os maiores interessados no retorno presencial das aulas, no entanto, a pandemia não arrefeceu. O MEC erra ao lançar uma portaria que indica o retorno presencial das aulas, e ao mesmo tempo não apresenta um plano, inclusive com aporte de recursos, para que as instituições de ensino possam cumprir condições de biossegurança. Retorno às aulas presenciais significa um deslocamento massivo de pessoas, tendo em vista que muitos estudantes voltaram para casa e estão em cidades/regiões diferentes das que estudam. Qualquer retomada total às atividades presenciais precisa ser escalonada e com um processo de transição com todos os cuidados necessários, planejamento e investimento. A autonomia universitária que tanto defendemos é importante para momentos como esse. As universidades têm o direito de decidir se acatam ou não as instruções da portaria, mas a maioria até o momento tem optado por manter as atividades no modo remoto”, destacou a entidade em sua conta no Twitter.

Iago Montalvão, presidente da UNE, foi taxativo ao afirmar que “não há possibilidade de retorno de aulas presenciais nas universidades sem um plano de transição”.

“Em um campus circulam milhares de pessoas advindas de dezenas de regiões e municípios, cotidianamente, suscetíveis à contaminação. Diferente de outras atividades, em especial as econômicas, as universidades têm conseguido manter algum nível de funcionamento, ainda que defasado, mas não pararam suas atividades. Por isso é irresponsável e equivocada a posição do MEC ao publicar essa portaria! Isso parece ser resultado da pressão do setor privado de ensino superior, que mais uma vez demonstra seu gosto pelo lucro acima da educação e da vida. Lutaremos pela derrubada da portaria. Mas qualquer universidade tem autonomia para decidir se fará o retorno presencial ou não”, pontuou.