A Câmara aprovou nesta quarta-feira (10) o projeto de lei complementar (PLP 19/19) do Senado, que confere autonomia ao Banco Central e prevê mandatos do presidente e diretores de vigência não coincidente com o mandato do presidente da República.

Na avaliação da Bancada do PCdoB, com a instituição de mandatos fixos da diretoria, não coincidentes com o do presidente da República, o objetivo é afastar o poder das urnas dos desígnios da política monetária, para priorizar a estabilidade da moeda e do sistema financeiros sobre todas as demais demandas econômicas e sociais, ampliando o abismo entre ricos e pobres.

"O Banco Central é responsável pela política monetária, pelo controle da inflação, pela circulação da moeda. É, portanto, um importante instrumento de política econômica. Estabelecer autonomia completa e ainda com mandatos que ultrapassem o mandato do Presidente da República é usurpar o poder do voto e das atribuições da presidência. Significa que, mesmo sendo eleito democraticamente, o presidente não poderá executar suas propostas porque a diretoria do banco foi indicada pelo antecessor", argumentou o líder do partido, deputado Renildo Calheiros (PE).

Segundo o parlamentar, isso fará com que a política econômica do país seja determinada pelo mercado financeiro, por pessoas que não foram eleitas por ninguém. Ou seja, o voto popular perderá peso para o mercado na definição dos rumos da economia. "E o mercado não tem olhos para os 14 milhões de desempregados e nem para nossa população que tanto tem sofrido", apontou Calheiros.

Pelo projeto, os mandatos dos diretores do BC serão de quatro anos e haverá um escalonamento para que apenas no terceiro ano de um mandato presidencial a maioria da diretoria e o presidente do banco tenham sido indicados pelo mandatário do Poder Executivo. A indicação continuará dependendo de sabatina no Senado. A matéria foi aprovada com o parecer favorável do relator, deputado Silvio Costa Filho (Republicanos-PE).

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-SP) alertou que o texto aprovado, sob intensos protestos da Oposição, não tem qualquer urgência para o povo brasileiro, mas lamentavelmente entrou em votação a toque de caixa com um pedido de urgência imposto pelo governo. "Acho lamentável que a Câmara seja apenas um poder homologatório do texto do Senado", disse.

"Nós estamos tratando de um Banco Central do Brasil, um banco que trata da política monetária, da política cambial, da liquidez de mercado, dos juros, trata das reservas internacionais, trata de muita coisa que implica a vida do povo brasileiro", observou Jandira.

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) reforçou a necessidade de se fazer um debate mais aprofundado da matéria. Ele também considerou que a Câmara não deveria adotar a postura de ser apenas um carimbador de projetos vindos do Senado, "muito menos um lugar que vai apenas ratificar ordens emanadas do Ministério da Economia". Até porque Paulo Guedes é um líder da economia sem noção. O Brasil é uma nau à deriva. Nós não temos estratégias de desenvolvimento econômico", acrescentou.

"Em vez de ficar a serviço do interesse do mercado financeiro, a Câmara dos Deputados deveria estar debatendo, neste momento, a retomada do auxílio emergencial, para garantir condições mínimas de dignidade para o povo trabalhador, que passa a conviver com a miséria, com a pobreza e com a fome. A Câmara dos Deputados deveria debater medidas para garantir vacinas mais rápido para todo o nosso povo, que é a medida efetiva para garantir a retomada da atividade econômica do país", assinalou o parlamentar.

Para a deputada Alice Portugal (PCdoB-BA), o projeto transforma o BC em uma superestrutura similar a uma agência de bancos privados. A parlamentar advertiu que a autonomia prevista na proposta "na verdade, não é autonomia, é a captura do Banco Central pelo setor privado". "Infelizmente, nenhuma amarra, nenhuma âncora no sentido de garantir a exclusividade de ações de Estado. O Banco Central passará a ser uma agência do interesse dos bancos privados", pontuou.

A vice-líder do PCdoB, deputada Perpétua Almeida (AC), defendeu a aprovação de um destaque apresentado pela Bancada do partido, visando assegurar que durante o período de quarentena após o mandato os ex-diretores da instituição sejam impedidos também de prestar serviços de consultoria.

"Se nós tomamos uma decisão aqui, que considero muito importante, de que, durante a quarentena, os ex-diretores do Banco Central não podem trabalhar com empresas privadas é porque consideramos isso de grande importância. Agora, eu pergunto para os senhores: será que basta proibirmos os ex-diretores de trabalhar em empresas privadas quando eles poderiam também trabalhar em empresas de consultoria que prestam serviços a essas instituições financeiras?", questionou.

Pandemia

Os deputados da Bancada avaliam, por fim, que votar essa matéria neste momento de pandemia subverte as prioridades de enfrentamento ao coronavirus e de mitigação dos efeitos sociais, sanitários e econômicos da pandemia. A autonomia do BC não enfrenta a pobreza, o crescimento do desemprego e são falaciosas as argumentações de que essa autonomia equaciona o crescimento econômico.

Em mensagem divulgada nas redes sociais, a deputada Professora Marcivânia (PCdoB-AP) sublinhou que o projeto aprovado, ao contrário do que muitos segmentos do mercado tentam propalar, não será bom para o Brasil, especialmente para a população mais carente.

"A nossa economia ficará à mercê dos interesses dos grandes grupos econômicos e as grandes decisões serão tomadas não considerando o que seja melhor para o conjunto da nação, mas sim, o que seria mais adequado aos interesses dos mais ricos. Basta olharmos para o que aconteceu no Brasil como consequência da terceirização, da reforma da Previdência e da reforma trabalhista. Todas essas medidas, aprovadas com discurso semelhante, representaram, na verdade, enormes perdas aos trabalhadores", escreveu no Twitter.