A Câmara dos Deputados realizou, nesta quarta-feira (20), sessão solene para homenagear os 100 anos do ex-presidente João Belchior Marques Goulart, o Jango, deposto por um golpe civil-militar em abril de 1964.

A sessão foi requerida pelo PCdoB, PDT, PSB e PTB. “Esta é uma homenagem cheia de simbolismos e com grande significado histórico. Jango dizia que os trabalhadores o teriam ao seu lado, mesmo que isso desagradasse as elites. E assim o fez com seu compromisso com as reformas de base. No célebre comício de 13 de março de 1964, Jango dizia que a democracia que eles desejavam impingir a nós é a democracia antipovo, antissindicato”, pontuou o líder da bancada comunista, deputado Daniel Almeida (BA).

No referido comício, o ex-presidente fez uma ampla defesa das Reformas de Base, apontando-as como o início para mudanças sociais há muito ansiadas pela população. A reação conservadora, no entanto, foi rápida. Dias depois uma Marcha da Família com Deus pela Liberdade foi organizada contra João Goulart. Em 31 de março de 1964, um golpe militar foi deflagrado, depondo Jango e pondo fim à pretensão de realização das Reformas de Base.

O parlamentar fez um paralelo com o atual momento político do país, onde o governo Bolsonaro tenta fragilizar os sindicatos com a Medida Provisória 873/2019, que mexe na contribuição sindical, desmonta as estruturas do Estado de atendimento à população, como com a extinção do Ministério do Trabalho e a Reforma da Previdência, além da entrega da soberania nacional, como no caso da base de Alcântara.

“Se fizermos um paralelo com os dias de hoje, ainda essa semana, Jair Bolsonaro, nos EUA, afirmou que um dos objetivos de seu governo não é construir coisas em defesa do povo, mas desconstruir. E reforçou que seu objetivo é impedir o comunismo e o socialismo. Eles querem acabar com os direitos do povo, dos nossos trabalhadores. A Reforma da Previdência é a expressão mais clara desse objetivo. Por isso, este é um debate presente”, destacou.

O debate sobre a atualidade também esteve presente na fala do filho de Jango, João Vicente Goulart. Segundo ele, “quis o destino” que a homenagem ao centenário de nascimento de seu pai se desse num momento crítico do país, “completamente diferente daquele que João Goulart defendeu”.

“Temos hoje o compromisso de dizer que estamos aqui não só para resgatar a história de Jango, mas para comparar dois momentos políticos da nação. Estamos aqui para dizer que temos que lutar por um país mais justo, democrático. Um país melhor para os mais necessitados, que estão perdendo sua capacidade de luta. O que presenciamos nesta visita aos EUA, com Jango não teria acontecido. Tem homens que caem de costas, outros caem de pé. Temos que resgatar as forças progressistas de forma pacífica, mas para lutar por um país melhor”, afirmou.

Um dos requerentes da homenagem, o deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) lembrou ainda do legado de Jango com as Reformas de Base. Sob essa denominação estavam as reformas agrária, bancária, fiscal, urbana, administrativa e universitária. Com as Reformas de Base, Jango pretendia alterar as estruturas da sociedade brasileira baseada na concentração de terras, propriedades e rendas, basicamente, além de propor algumas alterações na participação política da população.

“Precisamos falar sobre o legado de Jango, sobretudo as Reformas de Base e as Reformas Estruturais, que até hoje precisam ser feitas. Essa perspectiva das reformas para melhoria da vida do nosso povo é um importante legado do nosso ex-presidente João Goulart que precisa ser revisitado”, alertou.

Trajetória

João Goulart nasceu em 1º de março de 1919 em São Borja (RS). Começou sua carreira política como deputado estadual, em 1947. Em 1950 foi eleito deputado federal, sendo no ano seguinte indicado para o cargo de ministro do Trabalho no governo de Getúlio Vargas (1950-1954). Em 1955 foi eleito vice-presidente do Brasil, concorrendo pelo PTB. Na ocasião, conseguiu mais votos que o presidente eleito, Juscelino Kubitschek. Naquela época, as votações para presidente e vice eram separadas.

Na eleição seguinte, em 1960, foi novamente eleito vice-presidente, concorrendo pela chapa governista, ao lado do marechal Lott, e em oposição ao candidato Jânio Quadros, da UDN, que venceu a disputa. Jango ficou no cargo por apenas oito meses, quando assumiu o posto de presidente com a renúncia de Jânio, em agosto de 1961. Deposto em abril de 1964, o político gaúcho morreu durante seu exílio na Argentina, em 1976.

Salário mínimo

Durante a sessão, o deputado Pompeo de Mattos (PDT-RS), que conduziu os trabalhos, além de celebrar a “vida de um trabalhista que lutou pelo seu povo”, lembrou do empenho de Jango por uma política de aumento real para o salário mínimo.

“Ele tornou o salário mínimo um salário decente. Um salário onde o cidadão tinha dignidade, podia viver com o salário, pagar a sua habitação, ter a comida, o estudo dos filhos, a luz, a água. Enfim, naquela época foi algo inusitado, um aumento de 100% do salário mínimo como o Jango fez como ministro do Trabalho do presidente Getúlio Vargas”, disse.