As comissões de Cultura e de Trabalho, Administração e Serviço Público realizaram uma audiência pública conjunta nesta quinta-feira (6) para tratar dos impactos das políticas afirmativas no Brasil, com base no livro Reafirmando Direitos: trajetória de estudantes cotistas negros (as) no ensino superior brasileiro, organizado pelo professor Rodrigo Ednilson de Jesus, da Universidade Federal de Minas Gerais. A autoria do debate é dos deputados Orlando Silva (PCdoB-SP) e Áurea Carolina (PSol-MG).

Para Jesus, a sensação era sempre que as pessoas se posicionavam a favor ou contra as cotas, mas sem ter uma avaliação dos impactos que essa política já tinha na nossa sociedade. São duas décadas de ações afirmativas e temos, já hoje, condições de avaliar a efetividade dessa política. Não apenas no que ela interfere na vida dos estudantes, mas na estrutura das próprias universidades”, afirmou Rodrigo Ednilson de Jesus sobre o impulso de organizar a pesquisa. Para ele, sem dados, não era possível tratar avanço das políticas afirmativas no país.

A obra reúne histórias de estudantes negros e indígenas, de universidades federais e estaduais do país, sobre os desafios para chegar, permanecer e concluir o curso superior com qualidade. O livro foi coordenado pelo Programa de Ações Afirmativas na UFMG, em articulação com equipes regionais da Unifap (Universidade Federal do Amapá); UFRN (Universidade Federal do Rio Grande do Norte); UFRB (Universidade Federal do Recôncavo da Bahia); UFSCAR (Universidade Federal de São Carlos); UFG (Universidade Estadual de Goiás) e UFSC (Universidade Federal de Santa Catarina).

Para a ex-ministra de Igualdade Racial Nilma Lino Gomes, as políticas de ações afirmativas têm um caráter emergencial.

"Significa que o Estado reconhece que é preciso fazer algo urgente para superar aquele estado de desigualdade presente na sociedade. Elas não vêm ferir a igualdade de direitos, mas aprofundar a igualdade de direitos", explicou.

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) reforçou a importância do avanço da política de cotas.

“Após anos de aplicação de políticas de ação afirmativa, vemos uma mudança no perfil da universidade. Há um impacto na elevação da escolaridade dos negros do Brasil e da renda. Esses são os objetivos das ações de políticas afirmativas. Precisamos enfrentar uma desigualdade construída historicamente. Por isso, nosso objetivo é estimular a avaliação dos impactos dessa política. Pois em 2022 ela deve ser revista”, disse o parlamentar.

A Lei 12.711/2012, conhecida como Lei de Cotas, garante a reserva de 50% das matrículas em universidades e institutos federais de educação para estudantes de escolas públicas autodeclarados pretos, pardos e indígenas. Em seu artigo sétimo, a legislação prevê a revisão de suas regras após 10 anos de sua publicação. A ação afirmativa é fruto da atuação do movimento negro brasileiro e teve como objetivo ampliar a presença da população negra no ensino superior, como ação de reparação ao racismo estrutural que historicamente produz a violação dos direitos humanos dessas comunidades.

“Ajustes em políticas públicas são permanentes. Em 2022 teremos condições de fazer um balanço dessa experiência e reafirmar essa política de cotas, de modo que possamos superar essas desigualdades, que, historicamente foram construídas em nosso país. É fácil falar em meritocracia, mas como falar nisso no Brasil, se não há as mesmas condições? Falar em fim de cotas, num país que deu apenas os primeiros passos, é um crime contra a democracia brasileira. Temos que avançar nas políticas de ações afirmativas”, enfatizou Orlando Silva.

O parlamentar sugeriu encaminhar, ao lado da deputada Áurea Carolina, um requerimento de informações da Câmara ao Ministério da Educação (MEC) para que o órgão comunique quais foram e quais são as medidas de avalição do MEC para as políticas de cotas nas universidades brasileiras.

“Quero ser surpreendido com as informações, de modo que possamos demonstrar que essas avaliações estão sendo feitas. Pois não temos o direito de debater em 2022 a revisão da política de cotas sem uma avalição precisa, uma mensuração exata do impacto que essas políticas tiveram em nosso país. Se o MEC tiver essa avalição eu vou aplaudi-los, se não tiver nós temos que exigir que essa avaliação seja feita”, reforçou Orlando Silva.

Áurea Carolina concordou com o envio do documento. Segunda ela, está entre as atribuições do MEC fazer a avaliação do impacto. “Não é hora de interromper essas políticas, pois a razão não foi cessada. O racismo permanece no Brasil”, pontuou.

O documento deve ser enviado nas próximas semanas.