O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) reagiu à declaração feita pela apresentadora Xuxa Meneghel na última semana. Em uma live sobre direitos dos animais, promovida pela Assembleia Legislativa do Rio de Janeiro (Alerj), Xuxa defendeu que presos sejam utilizados para experimentos, testes de vacinas, remédios. Antes, ela havia condenado testes de cosméticos e medicamentos em animais de laboratório.

Para o parlamentar, a fala de Xuxa sobre presos “não foi apenas infeliz”. “Ela é reveladora da mentalidade medieval e cruel de parte da população para quem a privação da liberdade não basta como pena ao detento. Sádicos, consideram que torturas e sevícias são necessárias. Não é pena, é vingança”, declarou.

O discurso repercutiu mal. Além do desconhecimento ao regime prisional brasileiro, que não prevê prisão perpétua, a declaração de Xuxa indicou desprezo pela vida humana. No Twitter, expressões como “Xu Xu Klan”, “Xuxa nazista” e “Xuxa Menenghele”, em referência ao médico nazista Josef Mengele, que fazia experiências desumanas com prisioneiros de campos de concentração na Alemanha nazista, estiveram em alta.

O rapper GOG foi um dos que também condenou a fala da apresentadora.

“Xuxa, sua fala foi e sempre será desumana. A ideia já foi testada à exaustão nos campos de concentração. E continua sendo executada hoje, através da necropolítica”, destacou.

Pedido de desculpas

Horas depois, na madrugada do sábado (27), a apresentadora postou um vídeo na sua conta do Instagram com um confuso pedido de desculpas.

“Estou aqui pedindo desculpas para vocês, não usei as palavras certas. Pensei muitas coisas e quis falar sobre muitos assuntos, sobre maus tratos aos animais, e fiz a mesma coisa, também julguei e maltratei. A todos vocês que me julgaram, julgaram certo, eu errei e estou aqui pedindo desculpas a vocês”, disse Xuxa.

“Quem sou eu para dizer que essas pessoas estão ali e que devem ficar ali ou morrer ali? Quem sou eu para fazer isso? E se eu faço isso eu estou sendo ruim tanto quanto as outras pessoas que maltratam outras vidas, que não deveriam fazer isso."

Violações de direitos

O discurso da apresentadora chama atenção para outro problema: a violação dos direitos no sistema prisional. Falar sobre direitos para quem cometeu crimes ainda é um tabu na sociedade brasileira, que, em parte, parece compactuar com as violações sofridas pelos presos. 

Levantamento realizado pela Pastoral Carcerária, e publicado pela Agência Pública, revela que, em um ano de pandemia, houve aumento de 82% nas denúncias envolvendo violações de direitos em relação ao mesmo período do ano anterior. Entre 15 de março de 2019 e 14 de março de 2020, foram 92 denúncias. Já de 15 de março de 2020 a 14 de março de 2021, 168.

Entre as queixas recebidas, as mais recorrentes estão relacionadas à negligência na prestação da assistência à saúde (109 casos), falta ou assistência precária no fornecimento de alimentação, vestuário, produtos de higiene pessoal e limpeza (91) e agressões físicas (89).

Quando somadas as espécies de violações, o número absoluto chega a 557. Isso acontece porque num único caso pode haver mais de um tipo de violência, revela a reportagem.

“Se um familiar ou o próprio preso faz uma denúncia falando que não está recebendo atendimento médico e ao mesmo tempo está sofrendo uma agressão física ou não está recebendo alimentação adequada, a gente faz um único caso no cadastro e coloca a espécie da violência. Então esse único caso, por exemplo, vai ter três espécies de violência. A partir do número de casos fazemos essa diferenciação”, explicou Lucas Gonçalves, assessor jurídico da Pastoral Carcerária Nacional à reportagem da Pública.

Invisibilidade na pandemia

Com o cancelamento das visitas durante a pandemia, familiares ficaram sem acesso às unidades e sem ter informações sobre os seus parentes por meses.

Também foram impostas barreiras no envio de produtos de alimentação e higiene aos encarcerados.

“A pandemia fez aumentar a falta de informação, fez aumentar o isolamento e entendemos a tortura também como crime de oportunidade. A incomunicabilidade causada pelas medidas restritivas que a pandemia acabou impondo, favorecem as práticas de tortura que ganham um terreno fértil pra proliferarem”, aponta o perito do Mecanismo Nacional de Prevenção e Combate a Tortura (MNPCT) Daniel Melo.