A Câmara aprovou, em 2º turno, a PEC Emergencial (PEC 186/19), que impõe um brutal ajuste fiscal aos entes federados, a pretexto de permitir ao governo federal pagar mais uma rodada de ajuda às pessoas mais vulneráveis durante a pandemia de Covid-19. A chamada “PEC do arrocho” penaliza servidores públicos da União, estados e municípios, sem definir entretanto o valor do auxílio.

O texto principal da proposta de emenda à Constituição foi aprovado em segundo turno nesta quinta-feira (11) por 366 a 127.

A matéria possibilita o pagamento de novas parcelas do auxílio emergencial, mas com uma despesa limitada a R$ 44 bilhões por fora do teto de gastos. De acordo com o governo, essa nova etapa do benefício deve variar de R$ 175,00 a R$ 375,00 e será paga por quatro meses (março a junho).

A primeira leva de pagamentos do auxílio em 2020 chegou a R$ 292 bilhões para cerca de 68 milhões de pessoas, em duas rodadas: na primeira, foram pagas parcelas de R$ 600 por cinco meses; e na segunda, chamada de “auxílio residual”, foram parcelas de R$ 300 durante quatro meses e com um público-alvo menor.

Em alinhamento ao posicionamento adotado pelos partidos da oposição, os deputados do PCdoB reforçaram a luta pela retomada do valor de R$ 600,00 para o auxílio, enquanto durar a pandemia do coronavírus, além de defender mudanças no texto para mitigar os danos às categorias do serviço público.

O líder do partido na Câmara, deputado Renildo Calheiros (PE), reiterou que o PCdoB defende o valor pago inicialmente no auxílio emergencial, para todas aquelas pessoas que receberam o benefício durante a primeira fase do pagamento. Com o intuito de viabilizar a proposta, a Bancada apresentou destaque para eliminar o teto de R$ 44 bilhões, que funciona como limitador ao benefício.

"Nosso povo está se acabando nas filas das UTIs. O povo está se acabando desempregado, sem a assistência devida. O que pode chegar neste momento ao povo é esse auxílio emergencial, além das vacinas que são necessárias. É necessário que esta Casa faça um esforço para socorrer a população. O PCdoB quer R$ 600,00 como auxílio emergencial", afirmou. O parlamentar acrescentou: "Querem estabelecer um patamar de R$ 250,00, quando um botijão de gás custa mais de R$ 100,00. Isso é um absurdo! É o abandono da população! É o descaso com o povo!".

Obstrução garante avanços

Renildo Calheiros destacou, entretanto, os avanços assegurados pela luta travada pela oposição durante a análise da proposta. Entre eles, a aprovação de um destaque que garantiu a vinculação dos recursos de receitas para fundos constitucionais estratégicos para o Brasil. Com a supressão deste trecho que estabelecia a desvinculação de verbas hoje carimbadas para fundos públicos, como os destinados ao meio-ambiente, direitos humanos e a auditores fiscais, essas áreas permanecem com a verba garantida.

Outra derrota política do governo ocorreu na votação do destaque para retirar da PEC a proibição de estados e municípios concederem progressão funcional e promoção a servidores. O apoio da bancada da segurança ao destaque forçou o governo a propor um acordo que beneficiou o funcionalismo público.

"Essa conquista deve ser comemorada. Ela é resultado de um grande esforço que a oposição fez, que deixa outras lições. Se os parlamentares que têm compromisso na luta contra o arrocho dos servidores se juntarem, é possível termos mais vitórias. Mesmo limitado, o direito à promoção e à progressão é uma conquista para o serviço público, servidores civis e militares", observou.

Teto de gasto

A deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) denunciou a chantagem do governo, que vinculou um auxílio emergencial mínimo ao ajuste fiscal, sem estabelecer com clareza os critérios para a concessão do benefício. "Reduzimos danos, mas o dano maior é contra o Estado brasileiro, contra a boa-fé da população, que será bombardeada com mentiras sobre o auxílio emergencial", disse.

"É importante dizer ao povo brasileiro: esta PEC não garante o auxílio emergencial. Tampona, inclusive, o orçamento, tirando direitos dos serviços e dos servidores públicos, e não garantirá R$ 250,00 sequer para quem recebeu os R$ 300,00 na temporada anterior. São três meses sem receber nada. A fome avizinha-se e Bolsonaro precisa ser desmascarado", acrescentou.

Para a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), a emenda é consequência da concepção negacionista do governo em relação à gravidade da doença causada pelo coronavírus, que foi chamada de "gripezinha" pelo presidente Jair Bolsonaro. "Um país que está batendo recordes de mortes não consegue compreender que a saúde é direito de todos e dever do Estado, continua cortando despesas e não compreendendo a necessidade social do auxílio. O auxílio emergencial não é a razão de ser desta PEC, nem nunca foi", observou.

O destaque da Bancada que pretendia excluir do texto o valor máximo de R$ 44 bilhões para pagamento do auxílio emergencial em 2021, por fora do teto de gastos e da meta de resultado primário deste ano, foi rejeitado por 338 votos a 143.

Chantagem

O deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA) criticou a forma açodada como a matéria tramitou, colocando a proposta de emenda à Constituição como uma verdadeira chantagem para fazer o ajuste fiscal e prejudicar o serviço público e os servidores brasileiros.

"Fica claro que esta PEC é apenas um grande e criminoso arrocho fiscal, para diminuir as ações que o poder público precisa fazer em todas as áreas de enfrentamento à pandemia, cuidando das vacinas, cuidando da renda emergencial – que nós queremos R$ 600,00 pelo tempo necessário até o enfrentamento final desta pandemia. Nós precisamos rapidamente cuidar da proteção dos empregos, para que aqueles interrompidos em função da diminuição da atividade econômica sejam assegurados, como fizemos no ano passado. Nós precisamos cuidar da proteção do pequeno e micro empresário, especialmente nos setores de serviços", enfatizou.

A vice-líder do PCdoB na Câmara, deputada Perpétua Almeida (AC), também considerou inoportuna a aprovação de um arrocho fiscal, diante do aumento da necessidade de aplicação de mais recursos públicos no combate à pandemia.

"Faltam UTIs nos hospitais brasileiros e a culpa é do presidente Bolsonaro e do Pazuello (ministro da Saúde), porque eles estão retirando UTIs dos hospitais. Vejamos: em dezembro, o SUS financiava 60% do custo de uma UTI. Em janeiro, eles reduziram isso pela metade. E, desde fevereiro, Bolsonaro paga apenas 15% do custo de uma UTI. No momento mais difícil da pandemia, em que já morrem mais de 2 mil pessoas por dia, os brasileiros estão na fila da morte, porque o governo se recusa a fazer a parte dele que é bancar as UTIs pelo SUS. Esse foi o motivo, inclusive, que fez o governador (do Maranhão) Flávio Dino entrar no Supremo Tribunal Federal com o pedido para que o governo federal seja obrigado a bancar o custo das UTIs, conforme obrigação do SUS", afirmou.

Tramitação

Como o texto sofreu alterações, a consultoria técnica da Câmara deve analisar agora se encaminha a PEC diretamente à promulgação, sem necessidade de voltar ao Senado.