Somente se acompanharmos todo o debate sobre a aprovação da nova política de reajustes reais para o salário mínimo poderemos compreender o que está de fato escondido nas alegações proferidas pelo PPS, referendadas pelo PSDB e DEM e agora propagadas pela grande mídia. Alegam agora que o texto aprovado pela Câmara subtrai competência legislativa.
A CF determina que o valor do salário mínimo seja definido por lei. Se uma lei é aprovada com esse conteúdo, resolvida a questão.


Pode uma lei determinar uma política de reajustes? Certamente, desde que não haja margem para a discricionariedade do Poder Executivo, pois a definição do o valor cabe à Lei.

O conteúdo aprovado pela Câmara cumpre exatamente esses requisitos. Estão fixados os índices: inflação do ano anterior, medido pelo INPC; e a expansão real do PIB, medida pelo IBGE. Cabe a um decreto “declarar” qual é o resultado dessa soma composta que resulta no valor. Não há margem para juízos de oportunidade e conveniência, nem para qualquer opção. Todos os índices estão fixados pela lei. Há ainda procedimentos únicos que deverão ser observados diante da demora da divulgação oficial dos referidos índices.

Vale ainda ressaltar que o Brasil já viveu com políticas salariais em períodos anteriores. Leis definiam os índices de reajustes e nem sequer tinham termo final. Pretendiam a manutenção desse mecanismo indefinidamente. Houve períodos de reajustes mensais, quando a lei fixava, da mesma forma, os índices a serem aplicados. Tivemos o período do gatilho, e da mesma forma, uma lei determinava os procedimentos, o governo cumpria. Nada disso subtrai competência do Legislativo.

Então, o que está por trás desse orquestrado debate?

As políticas salariais anteriores tratavam da correção monetária do valor do salário mínimo. O texto votado inova ao estabelecer para o próximo quadriênio uma política de ganhos reais.  A oposição à política voltada está mais por esconder a sua insatisfação à garantia de que, nos próximos quatro anos, o salário mínimo terá ganho real pautado pelo crescimento da economia. O de 2012 já está praticamente definido e deve superar os 7,5% relativos ao PIB de 2010 (a esse índice será somado a inflação de 2011, que deve gravitar em 6%). O de 2013, da mesma forma, pois é esperado um crescimento do PIB em 2011 de pelo menos 4%.  Para 2014, ninguém aposta num reajuste menor.

Não acredito que os parlamentares que aventaram esses argumentos desconhecem esses fatos. Alguns deles votaram essas mesmas leis que criaram aquelas políticas de correção do salário mínimo. Quanto aos jornalistas que aparentam desconhecer a história, que fazer?

Muito mais provável que esses senhores não gostem mesmo é que leis estabeleçam políticas salariais. Vale lembrar que última política de reajustes para o salário mínimo foi exatamente extinta pelo Plano Real, que acabou com essa indexação para os salários. Para eles nada de garantias para a qualidade de vida do trabalhador, porque essa indexação somente deveria prevalecer para a dívida, contratos de concessão e valores de pedágios, contas de luz e para outros preços de serviços privatizados (indexados ao IGP-M ou IGP-DI), enfim para a defesa desses grandes interesses. Os salários podem e devem sempre perder para a inflação, porque assim facilita-se o processo de ajuste de custo (e de lucro) das empresas.

Transformar em lei uma política de valorização do salário mínimo é uma grande vitória. Significa um contraponto ao projeto neoliberal, que sempre defendeu a flexibilização das relações trabalhistas, inclusive quanto a sua remuneração. A política aprovada indexa o salário mínimo simultaneamente à inflação e ao crescimento real do PIB. Trata-se de um ponto importante para a manutenção do poder de compra e para assegurar que o crescimento da riqueza produzida seja minimamente distribuída.