Os ataques cada vez mais destemperados de Bolsonaro e seus principais auxiliares à imprensa, aos jornalistas, ao Parlamento, ao Supremo e a quase tudo aquilo que ainda lembra a institucionalidade democrática brasileira são evidências de que vivemos tempos anormais – e muito perigosos.  
 
Aqueles que acreditaram que Bolsonaro seria moderado pelo exercício do poder deram com os burros n`água e agora percebem, perplexos, que estamos diante de um presidente autoritário por convicção e com aspirações a déspota. O “teste de estresse” institucional permanente, conforme apontou Sergio Fausto, diretor da Fundação FHC, em entrevista ao Valor Econômico, é o modus operandi do bolsonarismo, com vistas a solapar a democracia e não a aperfeiçoar.
 
A tática consiste em atacar sempre e em várias frentes. Havendo reação à altura, ensaia-se um arremedo de recuo a pretexto de má compreensão ou distorção daquilo que foi dito. Mantendo-se em ofensiva permanente, Bolsonaro pode desviar o foco de assuntos que lhe são desfavoráveis, como a estranha morte do miliciano da cozinha de sua família, e avançar linhas rumo ao arbítrio, transformando as aberrações em “novo normal” da política.
 
Vou exemplificar para tornar mais nítido. O país mal se recuperou da grotesca e misógina afirmação do presidente sobre a repórter Patrícia Campos Mello – caso claro de quebra de decoro, diga-se – e seu braço direito, general Augusto Heleno, resolveu voltar suas baterias contra o Parlamento: “Não podemos aceitar esses caras chantageando a gente. Foda-se”, disse. Na mesma semana, dois golpes contra colunas mestras da democracia, a imprensa livre e o legislativo independente.
 
O ministro-chefe do GSI, inclusive, é reincidente em seus rompantes antidemocráticos. Basta lembrarmos que o general participou das manifestações de nítido viés fascista, em meados do ano passado, que tinham entre suas pautas o fechamento do STF e do Congresso, ou da contemporização quando Eduardo Bolsonaro ameaçou o país com a reedição do AI-5, entre outras posturas absurdas.
 
É muito preocupante o tipo de relação estabelecido pelo governo e figuras provenientes das Forças Armadas. Atualmente, os postos mais importantes do 1º escalão, aqueles do entorno do presidente, são exercidos por militares. As Forças Armadas desempenham importante papel institucional, são uma carreira de Estado, respeitadas pela sociedade. Esse valor simbólico, recuperado décadas após o término da ditadura, pode ser maculado ao deixarem que a instituição seja confundida com as idiossincrasias do presidente ou do governo.
 
O ano não será nada fácil para o país e para o governo. Os sinais apontam que a economia continuará se arrastando, sem a prometida retomada vigorosa. As complicações políticas e policiais que cercam o presidente e seu clã se avolumam e projetam turbulências ainda maiores que em 2019. Acuado e sem resultados a mostrar, a tendência é que Bolsonaro e seus sequazes se tornem mais agressivos e flertem com a ruptura.
 
Os otimistas dizem que as instituições estão funcionando, mas talvez a prudência recomende o questionamento no lugar da afirmação: funcionarão por quanto tempo? Daí a necessidade premente de unir as forças políticas e a sociedade para defender o país da maior das ameaças.
 
*Orlando Silva é deputado federal pelo PCdoB-SP