O golpe militar de 1964 completa 57 anos nesta quarta-feira (31), em meio a uma crise inédita: o desembarque dos comandantes das Forças Armadas do governo Bolsonaro na véspera, por discordarem das aventuras golpistas do presidente da República, após demissão do então ministro da Defesa, o general da reserva Fernando Azevedo.

Os atos de Bolsonaro, que já repercutiam no meio político desde a segunda-feira (29), quando o presidente iniciou seu troca-troca ministerial, e reforçou sua escalada antidemocrática, ganharam ainda mais críticas depois do primeiro ato público do novo ministro da Defesa, Braga Netto, que na noite de terça-feira (30), publicou uma ordem do dia alusiva ao aniversário de 57 anos do golpe militar de 1964, que ele chama de "movimento de 31 de março de 1964".

Nas palavras dele, coube às Forças Armadas a responsabilidade de pacificar o país, enfrentando desgastes para reorganizá-lo e garantir as liberdades democráticas de hoje. É o terceiro ano consecutivo que textos comemorativos ao golpe são publicados pelo governo na data.

A deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) rebateu a declaração de Braga Netto e lembrou que o golpe de 1964 instaurou uma ditadura no país, com retirada de direitos da população.

"Pacificação? Só se for a paz do silêncio, da censura e da falta de respeito sobre o desaparecimento de lutadores deste país. Das vozes dos gritos de torturados, dos lutadores pela restauração da democracia no campo e na cidade e nem dos familiares que até hoje buscam notícias dos seus entes queridos e que tem nossa total solidariedade. Não temos o que celebrar em 31 de março ou 1º de abril relacionado a 1964. É dia de reforçarmos, mais do que nunca, o grito pela liberdade e contra qualquer tipo de ameaça à democracia", afirmou a parlamentar.

A perseguição política instaurada pelo Estado brasileiro com o golpe de 1964 assassinou, prendeu e torturou quem lutava em defesa da liberdade democrática. No PCdoB, muitos tombaram.

Para o deputado Daniel Almeida (PCdoB-BA), não há como tolerar a celebração da data. "Não podemos tolerar que essa data seja exaltada. Não conseguimos ainda esclarecer episódios que fazem parte dessa trajetória histórica e que ainda é uma mancha no processo de aprofundamento e consolidação democrática. Hoje é dia de luto nacional, para rememorarmos um capítulo nefasto de nossa história. As práticas da ditadura militar tiveram papel significativo no desenvolvimento de uma cultura da violência, com invasões de domicílio, tortura e assassinato. Os familiares têm todo o direito de continuarem a exigir que os corpos daqueles que foram vítimas sejam identificados. O direito à memória e à verdade é algo que está incompleto", disse.

A deputada Alice Portugal (PCdoB-BA) destacou que a luta pela democracia, mais que nunca, está "na ordem do dia".

"Eu, que participei da luta contra a ditadura, a partir de meados da década de 70, que sou da geração da porta das cadeias, que vi presos políticos, recebi as cartas, em papel de seda, das torturas, sei exatamente que quem viu uma ditadura não quer viver outra. Ontem, nós vimos os arroubos autoritários de Bolsonaro se exacerbarem e constituírem uma atrapalhada militar. Não é possível mais alimentar o monstro! É necessário que os setores democráticos rebelem-se, levantem-se contra este governo", pontuou.

Para o líder do PCdoB na Câmara, deputado Renildo Calheiros (PE), é preciso proteger a Constituição e, dados os últimos acontecimentos no governo, a tarefa caberá ao Parlamento.

"É preciso proteger a Constituição. E quem vai fazer isso não é sequer o ministro da Defesa, não é sequer o comandante do Exército, mas é o Congresso Nacional, porque, se o comandante do Exército se opuser a qualquer orientação maluca do presidente, ele será demitido. Esse é um papel do Congresso Nacional. Nós teremos que regulamentar se pode ou não pode militar da ativa participar de postos de comando no governo, porque essa é a porta de entrada para a partidarização das Forças Armadas, para a politização das Forças Armadas. O Supremo (Tribunal Federal) e o Congresso precisam garantir a Constituição", disse.

Para Renildo, a escalada antidemocrática de Bolsonaro reitera a necessidade de reforçar a luta pela democracia. "Essa pauta entrou no centro da política nacional em razão da postura cada vez mais autoritária de Jair Bolsonaro.
Pelo terceiro ano consecutivo, o governo Bolsonaro celebra o golpe de 64, como se fosse um movimento legítimo. Não foi. Foi um golpe militar. Legítimo era o governo do presidente João Goulart. O momento atual é gravíssimo. É inaceitável que o presidente da República instigue militantes a defender o fechamento do Supremo Tribunal Federal. É intolerável que se tente subordinar o Congresso Nacional e politizar as Forças Armadas. O ódio aos governadores por adotarem medidas de combate à pandemia também é absurdo em meio a quase 320 mil mortes por coronavírus. Estamos no limiar da fronteira do que é compatível com a democracia", completou.

Governo celebra golpe; Brasil bate mais um recorde de mortes por Covid

Enquanto Braga Netto iniciava as celebrações governamentais, o Brasil batia um novo recorde de mortes por Covid-19. Foram 3.780 vidas perdidas para a Covid nas últimas 24h, de acordo com o levantamento do Conselho Nacional de Secretários de Saúde (Conass), totalizando mais de 317 mil brasileiros vítimas de uma política negacionista encabeçada pelo governo federal.

A deputada Professora Marcivânia (PCdoB-AP) lembrou que diante da grave crise sanitária vivida pelo país, a população deseja notícias sobre vacinas, não sobre celebração de golpe.

"Ninguém aguenta mais tamanho desleixo com os reais interesses dos brasileiros. Muitos estão morrendo por absoluta inação o governo federal e muitos seguirão perdendo a batalha contra a Covid-19, pois seu grande aliado é esse clima caos, alimentado diariamente. O que os brasileiros gostariam de estar vendo, neste momento, eram notícias sobre vacinação mais rápida, anúncios de medidas de recuperação econômica, garantia de emprego e renda. Contudo, são mergulhados, cada dia mais, nesse caos sanitário e sob ameaças antidemocráticas", destacou.

Para ela, a propagação do clima golpista é mais uma estratégia para "desviar a atenção do país em relação à mortandade pela Covid".

A vice-líder do PCdoB, deputada Perpétua Almeida (AC), também reiterou a responsabilidade do governo federal no elevado número de mortes pela Covid. "3.780 vidas. Bolsonaro genocida, sim!", afirmou.

O deputado Orlando Silva (PCdoB-SP) também chamou Bolsonaro de "genocida" e afirmou que o presidente faz "um governo de traição nacional, que já custou as vidas de mais de 317 mil brasileiros" e que "enfraquecido, tenta um golpe contra as instituições". "Vigilância e mobilização em defesa da democracia! #DitaduraNuncaMais", afirmou.