Sob a justificativa de ter recebido a notificação de um “evento adverso grave” relacionado à vacina Coronavac, desenvolvida pela chinesa Sinovac em parceria com o Instituto Butantan, a Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa) suspendeu, no dia 9 de novembro, os testes da vacina contra a Covid-19 no Brasil. A notícia ganhou rápida repercussão e a decisão da agência chegou primeiro ao Instituto Butantan pela imprensa.

O caso, no entanto, não tinha relação com a vacina e após intensa polêmica, que chegou até o Supremo Tribunal Federal (STF). No dia 11 de novembro, a Anvisa voltou atrás e autorizou a continuidade dos testes.

Para entender os critérios que levaram às ações consideradas precipitadas pelos parlamentares, a Comissão externa da Câmara que acompanha o enfrentamento à Covid-19 realizou na tarde desta terça-feira (17) uma videoconferência com o diretor-presidente da Agência Nacional de Vigilância Sanitária (Anvisa), Antonio Barra Torres; o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas; o secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Hélio Angotti Neto; e o gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes Lima Santos.

Uma das autoras do requerimento da audiência, a deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ) condenou a politização da vacina. A parlamentar lembrou que a decisão da agência reguladora foi utilizada pelo presidente da República como “vitória”, enquanto o país já somava mais de 160 mil mortes.

“Quando vimos essa polêmica em torno da suspensão dos testes fizemos esse requerimento. O número de casos no mundo está aumentando de novo, assim como no Brasil. Isso é preocupante, e por isso a necessidade avançarmos com a vacina. Vacina não é de governo nenhum, ela precisa de segurança. Não importa a nacionalidade, desde que defenda a vida do nosso povo. Por isso não cabe polarização, politização”, disse a parlamentar.

Jandira foi a primeira a questionar os critérios da Anvisa para a suspensão na noite do dia 9, visto que a agência teria uma reunião com o Instituto Butantan na manhã seguinte.

“O que me chama atenção é que na cronologia, o BO sobre a morte do voluntário foi no dia 29, o BO foi divulgado pela imprensa já com registro do suicídio. O comunicado feito pelo Instituto Butantan, sete dias depois, já é feito sem a relação entre o caso e a vacina. (…) A Anvisa, antes de conversar[com o Instituto Butantan] emite uma suspensão dos testes e vai para a imprensa. Parece-me que houve um procedimento incorreto, uma precipitação, além da publicização de uma situação privada de uma família, um desgaste da Anvisa, que teve que retroagir pela decisão, e deu margem ao chefe de Estado um comportamento ao qual a sociedade reagiu. Por que um procedimento à noite, às 21h30, se haveria uma reunião no outro dia pela manhã?”, questionou a parlamentar.

A resposta coube ao gerente-geral de Medicamentos e Produtos Biológicos da Anvisa, Gustavo Mendes Lima Santos. Segundo ele, os técnicos do órgão foram cautelosos, pois não tinham informações suficientes sobre o caso.

“Foi racional. O que nós tínhamos ali era apenas a informação que ele havia ocorrido e que ele se relacionava de alguma forma ao estudo em andamento. Não havia ainda uma manifestação do comitê independente de segurança. Já enfrentamos várias situações. Nós trabalhamos no princípio da precaução, zelo, sempre. Trabalhamos com dados. Naquele momento era importante tomar uma medida urgente”, declarou.

A justificativa de Mendes não convenceu os parlamentares, que reforçaram que a agência poderia ter esperado a reunião da manhã seguinte para ter as informações necessárias para tomar uma decisão embasada.

Para a líder do PCdoB, deputada Perpétua Almeida (AC), a ação da Anvisa nesse caso foi grave. “A Anvisa primeiro atirou e depois foi buscar as informações. Isso é muito grave. A Anvisa deveria, neste momento tão dramático, como instituição responsável por encontrar saídas, ter tido uma postura diferente”, cobrou.

Gustavo Mendes defendeu a postura da agência. “Os estudos clínicos ainda são momentos de estudo das vacinas, onde se checa sua segurança e eficácia. Estamos vivendo uma situação que nossos passos estão sendo avaliados e monitorados pela mídia constantemente. Nunca antes nossas análises foram difundidas como agora. É bom, pois a sociedade entende os procedimentos, há transparência dos fatos também”, explicou sobre o fato de a imprensa ter sabido da informação antes mesmo do Instituto Butantan.

Segundo o diretor do Instituto Butantan, Dimas Covas, a suspensão dos testes não chegou a afetar a pesquisa. “A suspensão foi conhecida só no dia 10. Neste mesmo dia houve a reunião com a equipe técnica da Anvisa. A paralisação não afetou os estudos, pois durou pouco tempo. Essa vacina brevemente estará disponível. Esperamos a conclusão desses estudos para proceder o registro. Cada dia conta”, declarou.

De acordo com os dados apresentados pelo secretário de Ciência, Tecnologia, Inovação e Insumos Estratégicos do Ministério da Saúde, Hélio Angotti, a expectativa de produção da Coronavac, caso os testes continuem avançando, é para o segundo semestre de 2021.