Fernanda Montenegro é sinônimo de grandiosidade. Na data em que completa 90 anos de nascimento, a atriz foi homenageada na Câmara dos Deputados, em Sessão Solene. Sua atuação nos palcos brasileiros, no cinema, na televisão e no rádio foi enaltecida por parlamentares de diferentes legendas e por cineastas que participaram do ato, requerido pelo líder do PSB, Tadeu Alencar (PE).

A homenagem a Fernanda também ganha relevância pelo momento político vivido. Desde setembro, quando foi capa da revista literária Quatro cinco um, a atriz virou alvo de ataques de alas do atual governo. Em uma publicação no Facebook, o diretor do Centro de Artes Cênicas da Funarte, Roberto Alvim, afirmou que a atriz era “sórdida” e “mentirosa, além de dizer que tem “desprezo” por ela. Ele considerou a imagem de capa da revista, onde Fernanda aparece como uma bruxa sendo queimada em fogueira de livros, “danosa para o Brasil e um ataque ao governo federal”.

Para a líder da Minoria na Câmara, deputada Jandira Feghali (PCdoB-RJ), não foi à toa que Fernanda foi agredida.

“A arte virou inimiga das pessoas toscas que ocupam este governo. Fernanda é uma mulher libertária, plena, aberta. Uma operária da arte. E a arte, para essas pessoas, é uma ameaça, pois não pode a arte viver sem liberdade. E quando nós pensamos num país com arte, com liberdade, diversidade, não conseguimos imaginar que uma pessoa como ela possa ser insultada por ninguém, muito menos por alguém que ocupe cargo público. Por isso, proponho que a gente se dirija ao ministro da Cidadania para pedir demissão do diretor da Funarte. Ele não pode continuar no cargo”, afirmou Jandira, sob aplauso dos presentes.

A parlamentar propôs ainda uma salva de palmas para Fernanda pela grandiosidade de seu trabalho.
O vice-líder do PCdoB, deputado Márcio Jerry (MA), também prestou sua homenagem à atriz. Segundo ele, os 90 anos de Fernanda Montenegro “carregam em si uma história que conjuga talento e compromisso”. “Vivemos um tempo em que é muito importante mobilizar corações e mentes e fortalecer o que é bom, o que é belo e justo. Não há como pensar uma civilização mais avançada se a gente colocar a cultura e a arte como algo negativo, como está presente em algumas narrativas. Por isso, viva Fernanda Montenegro, sua trajetória e arte e a cultura brasileira.”

O cineasta Luiz Carlos Barreto afirmou ser difícil homenagear Fernanda. Um ano mais velho que a atriz, Barreto contou que já chegou a se recusar a falar sobre ela, por ter dificuldade em encontrar palavras para falar sua importância. “Esse ano mandei um bilhete junto com flores. Lá, escrevi “Você é pedra 90”. Pedra 90 é uma expressão popular dos morros do Rio de Janeiro para aquilo que é muito bom, que é excelente. Acho que a define bem”, afirmou.

Frente em defesa do cinema

A homenagem foi marcada pela defesa do cinema e da produção audiovisual no Brasil. Além de sua homenagem, Barreto aproveitou o anúncio do lançamento da Frente Parlamentar Mista em Defesa do Cinema e do Audiovisual brasileiro para cobra a regulação dos vídeos sob demanda (VOD).

Segundo ele, há cinco anos o país tentar regular esse meio de difusão de imagens, mas a pauta não avançou. “Essa nova tecnologia, o VOD, tem a obrigação de difundir, diversificadamente, todas as manifestações culturais. Nesse momento em que se homenageia Fernanda, é hora de falar sobre isso, porque outros exemplos como ela estão sendo sonegados. Essa frente precisa tratar da regulação do VOD”, afirmou o cineasta.

A pauta foi reiterada por outros profissionais do setor que participaram da homenagem. Para a cineasta e diretora da empresa de cinema e audiovisual de São Paulo, Laís Bodanzky, a regulação do VOD garantirá que a indústria nacional continue andando de “vento em popa”. Já o cineasta e diretor da Conexão Audiovisual Centro-Oeste, Norte e Nordeste (Conne), Renato Barbieri, afirmou que se o serviço de streaming é futuro, sua regulação é essencial. “O cidadão tem que ter a liberdade de escolher o produto brasileiro. Nós temos que ter na nossa gôndola o produto brasileiro. Se não estiver, como ele poderá escolhê-lo? Essa frente tem uma grande batalha. Temos que defender com unhas e dentes nossa produção audiovisual”, disse.

A frente teve apoio de 247 deputados e 22 senadores. Para o presidente do grupo, deputado Tadeu Alencar, no momento de desestruturação da cultura no país, a frente será um importante canal de resistência. “A frente, articulada com outras áreas da Casa, será de fundamental importância para resistir a iniciativas legislativas que precisam ser melhor discutidas ou até barradas”, afirmou.

O parlamentar disse ainda que além da valorização da arte e da produção cinematográfica em todas as regiões do país, a frente atuará ainda pelo fortalecimento da produção audiovisual.

O grupo contará ainda com coordenadores regionais. Os deputados Márcio Jerry e Perpétua Almeida (PCdoB-BA) serão responsáveis pelas ações no Maranhão e Acre, respectivamente. “Não estamos apenas juntando um grupo de parlamentares para debater, mas também para encaminhar proposições, cobrar do governo uma política que favoreça e não persiga o setor”, afirmou Jerry.

O secretário de Cultura de Pernambuco e representante do Fórum dos Secretários de Cultura do Nordeste, Gilberto Freyre Neto, afirmou que a paralisação de incentivos para o setor desmonta uma importante cadeia produtiva do país. “Ausência de uma política estratégica nesse campo coloca em risco toda uma cadeia, com profissionais talentosos, que movimenta a economia brasileira. É importante que esse fórum seja funcional e objetivo e impacte numa estratégia de desenvolvimento que olhe o futuro”, ressaltou.